Rev Cuid 2014; 5(1): 670-8
FATORES ASSOCIADOS AO DESMAME PRECOCE DO ALEITAMENTO MATERNO
FACTORS ASSOCIATED WITH EARLY WEANING OF BREASTFEEDING
FACTORES ASOCIADOS AL DESTETE PRECOZ DE LA LACTANCIA MATERNA
Flávia Andrade Fialho1, Amanda Martins Lopes2, Iêda Maria Ávila Vargas Dias3, Marli Salvador3
1Doutoranda, no Programa de Pós Graduação em Associação em Bioética, Ética Aplicada e Saúde Coletiva, Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Universidade Federal Fluminense (UFF). Rio de Janeiro, Brasil. Autor Correspondente: E-mail: flavinhafialho@bol.com.br Fone: (32) 3216-2299.
2Enfermeira e Pesquisadora do Núcleo de Pesquisa em Saúde Materno Infantil e Saúde Coletiva ( FACENF – UFJF) Juiz de Fora, Brasil.
3Profª da Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Juiz de Fora (FACENF - UFJF), Pesquisadora do Núcleo de Pesquisa em Saúde Materno Infantil e Saúde Coletiva (FACENF – UFJF). Juiz de Fora, Brasil.
Artículo recibido el 31 de Enero de 2014 y aceptado para su publicación el 02 de Abril de 2014.
Cómo citar este artículo: Andrade Fialho F, Martins Lopes A, Ávila Vargas Dias IM, Salvador M. Fatores associados ao desmame precoce do aleitamento materno. Rev Cuid. 2014; 5(1): 670-8.
RESUMO
Introdução: Apesar da comprovação das inúmeras vantagens do aleitamento materno e da melhora da situação do aleitamento materno entre as crianças brasileiras, o que se percebe é que a situação no país em relação à amamentação exclusiva ainda é preocupante. O percentual de crianças no primeiro semestre de vida, alimentadas somente com o leite materno, permanece muito aquém da recomendação do Fundo das Nações Unidas para a Infância, da Organização Mundial da Saúde e do Ministério da Saúde do Brasil. Acrescenta-se ainda que o aleitamento materno depende de fatores que podem influir positiva ou negativamente no seu sucesso, de modo que tais fatores refletem num desafio aos enfermeiros. Com o conhecimento dessa realidade pretende-se atingir os seguintes objetivos: conhecer a importância do enfermeiro no estabelecimento e manutenção do aleitamento materno e discutir os fatores que desencadeiam o desmame precoce. Materiais e Métodos: Para atender aos objetivos propostos elegeu-se a revisão bibliográfica. Resultados e Discussão: A análise dos dados resultou em três categorias temáticas: a prevalência do aleitamento materno no Brasil; os fatores que levam ao desmame precoce; e a promoção do aleitamento materno pelos profissionais de saúde, em especial o enfermeiro. Conclusões: Por fim pode-se dizer que além da vontade materna e da habilidade dos profissionais de saúde em promover o aleitamento materno, é preciso considerar que o sucesso da prática de amamentação depende também de políticas governamentais adequadas e do apoio e participação de toda sociedade.
Palavras chave: Aleitamento Materno, Desmame, Enfermagem. (Fonte: DeCS BIREME).
RESUMEN
Introducción: A pesar de la evidencia de las numerosas ventajas de la lactancia materna y mejorar el estado de la lactancia materna entre los niños brasileños, lo que vemos es que la situación en el país con la lactancia materna exclusiva sigue siendo preocupante. El porcentaje de niños en la primera mitad de la vida, alimentado sólo con leche materna se mantiene muy por debajo de la recomendación del Fondo de las Naciones Unidas para la Infancia, la Organización Mundial de la Salud y el Ministerio de Salud de Brasil. Además, que la lactancia materna depende de factores que pueden influir positiva o negativamente en su éxito, por lo que estos factores reflejan un reto para las enfermeras. Con el conocimiento de esta realidad que se pretende alcanzar los siguientes objetivos: conocer la importancia de las enfermeras en el establecimiento y mantenimiento de la lactancia materna y discutir los factores que desencadenan el destete precoz. Materiales y Métodos: Para cumplir con los objetivos propuestos fue elegida la revisión bibliográfica. Resultados y Discusión: El análisis de los datos resultaron en tres categorías temáticas: la prevalencia de la lactancia materna en el Brasil, los factores que conducen a un destete temprano, y la promoción de la lactancia materna por los profesionales de salud, especialmente las enfermeras. Conclusión: Por último, se puede decir que, además de la voluntad de la madre y la capacidad de los profesionales de la salud para promover la lactancia materna, se debe tener en cuenta que la práctica con éxito de la lactancia materna también depende de políticas gubernamentales adecuadas y el apoyo y participación de toda la sociedad.
Palabras clave: Lactancia Materna, Destete, Enfermería. (Fuente: DeCS BIREME).
ABSTRACT
Introduction: Despite the evidence of the numerous advantages of breastfeeding and improved breastfeeding status among Brazilian children, what we see is that the situation in the country with exclusive breastfeeding is still worrying. The percentage of children in the first half of life, fed only on breast milk remains well below the recommendation of the United Nations Fund for Children, the World Health Organization and the Ministry of Health of Brazil. It is further that breastfeeding depends on factors that may impact positively or negatively on your success, so that these factors reflect a challenge to nurses. With the knowledge of this reality it is intended to achieve the following objectives: to know the importance of nurses in the establishment and maintenance of breastfeeding and discuss the factors that trigger early weaning. Materials and Methods: To meet the proposed objectives was elected the literature review. Results and Discussion: Data analysis resulted in three thematic categories: the prevalence of breastfeeding in Brazil, the factors that lead to early weaning, and the promotion of breastfeeding by health professionals, particularly nurses. Conclusion: Finally it can be said that besides the mother's will and ability of health professionals to promote breastfeeding, you need to consider that the successful practice of breastfeeding also depends on appropriate government policies and the support and participation of the whole society.
Key words: Breast Feeding, Weaning, Nursing. (Source: DeCS BIREME).
INTRODUÇÃO
Embasadas pela atual política de aleitamento materno no Brasil, investigações científicas desenvolvidas nas últimas décadas contribuíram significativamente para o desenvolvimento de conhecimentos acerca dos benefícios do Aleitamento Materno (AM) para a saúde da criança e da mulher (1).
Tais benefícios podem ser representados de forma significativa pelo estreitamento do vínculo afetivo entre mãe e filho, associado a isso encontra-se ainda as questões nutricionais e fisiológicas responsáveis pela diminuição da morbimortalidade infantil e o pleno desenvolvimento da criança. Nesse sentido também, o aleitamento materno carrega consigo vantagens como: o valor nutricional e a proteção imunológica relativa à presença de fatores circulantes como lactoferrina, IgA secretora, anticorpos e outros (2).
Esse cenário de benefícios faz com que o Aleitamento Materno ocupe lugar de destaque entre as ações básicas de saúde, sendo recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) tanto na diminuição da morbidade e mortalidade das crianças, como também na melhora de sua qualidade de vida. Mas para isso, o aleitamento materno é preconizado como exclusivo, ou seja, sem uso de chás, água, sucos ou outros alimentos até os seis meses de vida (1).
Afinal, o desmame precoce, principalmente em populações de baixa condição sócio econômica, aumenta a morbimortalidade das crianças e compromete o crescimento e desenvolvimento destas. Esta dificuldade se revela num problema de saúde pública, pois é crescente o número de mães que optam por outros tipos de alimentos em detrimento do leite materno, por razões muitas vezes enraizadas nos aspectos culturais da população, que acredita que os alimentos lácteos não maternos podem trazer tantos ou maiores benefícios para o filho (3).
Tal crença seria de certo, equívoca, uma vez que durante a infância, ocorre a interação entre funções imunológicas e os fatores ambientais, infecciosos e nutricionais, sendo que o aleitamento materno tem um papel complementar fundamental na maturação imunológica. Por meio de propriedades anti-infecciosas, anti-inflamatórias e imunomoduladoras. Pode-se dizer que o aleitamento materno complementa ainda a imunidade secretora de lactentes contra patógenos gastrointestinais e respiratórios, além de estimular a maturação imunológica das superfícies mucosas, propiciando benefícios a longo prazo (4).
Com relação a esses benefícios a Organização Mundial de Saúde (OMS) publicou uma importante revisão sobre evidências desse efeito. Tal estudo concluiu que os indivíduos amamentados apresentaram pressões sistólica e diastólica mais baixas (-1,2 mmHg e -0,5mmHg, respectivamente), níveis menores de colesterol total (-0,18mmol/L) e risco 37% menor de apresentar diabetes tipo 2 (5).
Relevante destacar que não só o indivíduo que é amamentado adquire proteção contra diabetes, mas também a mulher que o amamenta. Foi descrita uma redução de 15% na incidência de diabetes tipo 2 para cada ano de lactação dessa mulher. Atribui-se essa proteção a uma melhor homeostase da glicose em mulheres que amamentam (6).
Já com relação à criança, pode-se inferir que a exposição precoce ao leite de vaca (antes dos quatro meses) é considerada uma importante determinante na prevenção do Diabetes Mellitus tipo 1, podendo aumentar o risco de seu aparecimento em 50%. Estima-se que 30% dos casos poderiam ser prevenidos se 90% das crianças até três meses não recebessem leite de vaca (1).
Evidências apontam que outro fator associado à amamentação seria à obesidade. A maioria dos estudos que avaliaram a relação entre obesidade em crianças maiores de três anos e o tipo de alimentação no início da vida constatou menor frequencia de sobrepeso/obesidade em crianças que haviam sido amamentadas. Os indivíduos amamentados teriam uma chance 22% menor de vir a apresentar sobrepeso/obesidade (7).
É importante observar que tal cenário de saúde e doença denúncia uma crescente preocupação com os efeitos prejudiciais do desmame precoce e representa atualmente uma unidade nas agendas de saúde coletiva do Brasil. Os modelos explicativos para a relação amamentação - desmame multiplicam-se e sinalizam para o embate entre saúde e doença, evidenciando os condicionantes sociais, econômicos, políticos e culturais que transformaram a amamentação em um ato regulável pela sociedade (8).
Ainda que haja evidências da melhora da situação do aleitamento materno entre as crianças brasileiras, o que se percebe é que a situação no Brasil em relação à amamentação exclusiva ainda é preocupante. O percentual de crianças no primeiro semestre de vida, alimentadas somente com o leite materno, permanece muito aquém da recomendação do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), da Organização Mundial da Saúde (OMS) e do Ministério da Saúde do Brasil (MS) (9).
De acordo com dados nacionais, o percentual de crianças alimentadas exclusivamente com leite materno é baixo já no primeiro mês de vida (47,5%). Na idade de 120 dias a proporção estimada foi 17,7% e aos 180 dias de 7,7% (9).
Partindo desse enfoque, acrescenta-se que o aleitamento materno depende de fatores que podem influir positiva ou negativamente no seu sucesso. Alguns desses fatores estão diretamente relacionados à mãe, como as características de sua personalidade e sua atitude frente à situação de amamentar, ao passo que outros se referem à criança e ao ambiente, como por exemplo, as suas condições de nascimento e o período pós-parto havendo, também, fatores circunstanciais, como o trabalho materno e as condições habituais de vida (10).
Percebe-se ainda que tais fatores refletem um desafio para os profissionais de saúde, uma vez que a amamentação depende das condições de vida e trabalho, do momento vivido pela mulher, de suas experiências anteriores, da trajetória cultural e, também, da compreensão que a sociedade tem a respeito da amamentação. Ajudar a mulher a estabelecer e manter essa prática é, portanto, uma tarefa bastante complexa (11).
Todavia percebe-se que os profissionais de saúde poderão compreender melhor as mulheres, caso conheçam suas visões particulares sobre o assunto (11). Este estudo encontra relevância à medida que proporciona aos profissionais de saúde o entendimento acerca da relação do ato de amamentar com as experiências vivenciadas pelas mulheres, suas percepções acerca do aleitamento materno e sobre si enquanto nutrizes, além das inseguranças e dificuldades enfrentadas por elas. Acredita-se que a construção desse conhecimento, de certo, auxilia o enfermeiro e demais profissionais de saúde a intervir de forma a incentivar e manter o aleitamento materno nos seis primeiros meses de vida.
Nesse sentido delimita-se como objeto desse estudo os fatores associados ao desmame precoce. Com o conhecimento dessa realidade pretende-se atingir os seguintes objetivos: conhecer a importância do enfermeiro no estabelecimento e manutenção do Aleitamento Materno (AM) e discutir os fatores que desencadeiam o desmame precoce.
MATERIAIS E MÉTODOS
A pesquisa pode ser definida de várias formas. Pesquisa como um procedimento reflexivo, sistemático, controlado e crítico que permite descobrir novos fatos ou dados, soluções ou leis, em qualquer área do conhecimento. Desta forma, a pesquisa é uma atividade voltada para a solução de problemas através do método científico (12).
O método científico é visto como método mais elevado de obtenção de conhecimento e tem sido utilizado de maneira produtiva por pesquisadores que se dedicam ao estudo de uma ampla gama de problemas que interessam ao desenvolvimento de uma base científica para a ciência (13).
Para atender os objetivos do presente estudo elegeu-se a pesquisa bibliográfica não sistematizada como abordagem metodológica a ser seguida. A pesquisa bibliográfica caracteriza-se num estudo realizado a partir de material já elaborado, constituído principalmente de livros, artigos de periódicos e atualmente com material disponibilizado na Internet (14).
Para tanto, foram adotadas como fonte de informação as bases eletrônicas de dados de Literatura Latino-Americana em Ciências da Saúde (LILACS), Scientific Electronic Library Online (SCIELO), Base de Dados de Enfermagem – BDENF, e outras literaturas não eletrônicas, publicados no período entre 2001 a 2010.
As palavras chaves utilizadas na realização das buscas foram aleitamento materno, desmame precoce e atuação do enfermeiro. Sendo permutadas da seguinte forma: “Aleitamento Materno and desmame precoce”, “Aleitamento Materno and atuação do Enfermeiro”.
Os critérios estabelecidos para a inclusão dos trabalhos foram: artigos publicados entre os anos de 2001 a 2010, no idioma português. Foram selecionados 20 artigos e os dados foram organizados de acordo com um instrumento que continha dados referente: a base de dados onde o artigo foi encontrado, descritores utilizados, nome do artigo, autores, periódico, país, ano, objetivo do artigo, área (enfermagem, medicina, bioética, fisioterapia, serviço social, psicologia, interdisciplinar, política). Subárea (saúde do adulto e idoso, da criança, da mulher, saúde mental, saúde coletiva, diretrizes, ensino).
Ao término da leitura dos artigos, partiu-se para a fase de análise e discussão dos artigos elencados, apresentada a seguir.
RESULTADOS
A revisão bibliográfica sobre essa temática permitiu o entendimento sobre possíveis variáveis que afetam o desmame precoce ou a extensão da amamentação. Tais influências tornam-se relevantes por estarem em consonância com a metodologia utilizada e com o objetivo proposto para essa investigação. Frente a isso, a construção desse conhecimento abordar questões referentes à prevalência do aleitamento materno no Brasil, os fatores que levam ao desmame precoce e a promoção do aleitamento materno pelos profissionais de saúde, em especial o enfermeiro (a).
Percebe-se que alguns dos registros citados são apontados por vários outros teóricos da área e como tal foram tratados em demais publicações científicas na área de saúde. Nesse sentido, algumas dessas variáveis merecem destaque como o percentual de crianças alimentadas exclusivamente com leite materno. No Brasil, evidências apontam para um baixo percentual de aleitamento, ou seja, já no primeiro mês de vida esse índice é em torno de (47,5%). Na idade de 120 dias a proporção estimada passou para 17,7% e aos 180 dias de 7,7% (9).
Faz destacar, que esta prevalência pode variar de acordo com os países, regiões e tipo de populações urbanas e rurais (16). No Brasil, a região apontada como a de maior prevalência de AME no sexto mês é a região Sul (10,2%), seguida da região Nordeste (8,4%), região Norte (7,0%), região Sudeste (6,7%) e por último a região Centro-Oeste (6,2%). Aliás a região Sul destaca-se com as maiores prevalências para todas as idades (9).
Já com relação ao tempo de duração do aleitamento materno, pode-se dizer que em termos relativos, comparando-se as taxas aos 30 dias e aos 180 dias de vida, houve redução de 21% na prevalência de aleitamento materno e de 84% de aleitamento materno exclusivo. Nesse sentido, uma pesquisa avaliou que a duração média do aleitamento exclusivo foi 3,3 meses, portanto bem menor do que preconizado pela OMS (2).
E essa redução temporal do aleitamento materno exclusivo é consequência de alguns fatores. Em um estudo feito com crianças atendidas pelo Programa de Saúde da Família, as mães alegaram alguns motivos para o desmame precoce. Entre as causas de desmame relatadas, 63,2% foram inerentes a mãe como: “leite secou“ (23,7%), “tinha pouco leite” (13,1%), “precisava trabalhar” (7,9%), “decidiu parar” (5,3%), “estresse”(5,3%), “recomendação médica” (5,3%), “fumante” (2,6%). E 36,8% foram inerentes à criança como: “chorava com fome” (18,4%), “não aceitava o peito” (15,8%), dificuldade de sugar (2,6%) (17).
Ao se referenciar essa correlação com o fator materno, faz-se necessário considerar o nível de escolaridade dessas mães. Nas referências analisadas, observa-se que àquelas com menor tempo de escolaridade tendem a desmamar antes dos seis meses. Em um estudo foi observado que a variável escolaridade materna se mostrou associada ao desmame precoce, isto é, quanto maior o tempo de escolaridade da mãe, maior a duração do aleitamento natural (18).
Agora não tem mais jeito para isso, fica de sugestão para um próximo estudo!!!
Da mesma forma em outro estudo foi relatada uma maior prevalência do aleitamento materno exclusivo entre mulheres com maior escolaridade, e concluíram que mulheres com maior nível de instrução estão em fase de valorização do aleitamento materno exclusivo, e que essa tendência não atingiu estratos socioeconômicos menos favorecidos (19).
Nesse sentido, outros fatores podem influenciar a prática da amamentação, entre eles o trabalho materno que muitas vezes está associado à emancipação da mulher e à necessidade de geração de renda para a subsistência familiar, a mulher - cuja importância social relacionava- se predominantemente a sua capacidade de gerar força produtiva - passou a ser impelida a contribuir de maneira direta na renda familiar e, assim, foi obrigada a assumir o ônus de uma tripla jornada: mãe, dona de casa e trabalhadora remunerada (20).
Embora, estudos mais recentes demonstrem que há maior prevalência de aleitamento materno entre as mães trabalhadoras (2, 17, 19), o emprego não é a maior causa do desmame e apesar da maioria das trabalhadoras utilizarem licença para amamentar, outros artifícios são utilizados para a manutenção da amamentação, como a retirada periódica de leite materno durante a jornada de trabalho.
No que diz respeito ao estado civil verificou-se maior prevalência do aleitamento materno ente as mulheres que convivem com o companheiro (17). Uma pesquisa realizada verificou que o apoio do companheiro é importante para superar as dificuldades presentes no ato de amamentar (21). Da mesma forma, que as mulheres que têm família estável, que moram com companheiros, amamentam significativamente mais tempo do que as solteiras (22). Nesse contexto, outro fator que merece destaque é a associação entre amamentação e as mulheres multíparas.
Em uma pesquisa foi constatado que mulheres primíparas apresentaram um risco duas vezes maior de desmamar precocemente do que as multíparas. Os autores do estudo justificam tal resultado ao fato das mulheres primíparas terem tido menor oportunidade de acesso às informações veiculadas na mídia e às ações de promoção do aleitamento materno do que as mães com mais filhos. Neste mesmo estudo as primíparas relataram maior dificuldade de amamentar pós-parto, o que demonstra um conjunto de deficiências na orientação da mãe para aspectos práticos da amamentação, apontando falhas desde o preparo das mamas na gravidez até a intervenção precoce no pós-parto (23).
Mais uma vez, percebe-se que o desmame muitos vezes é atribuído às mães, observando na literatura causas como: “o leite secou” e o “bebê chorava”. Tais estudos revelam inclusive que o choro do bebê foi uma das principais causas do desmame, sendo atribuído pelas mães à “fome”, ao “leite materno ser fraco” ou “não sustenta”. Desse modo a introdução de novos alimentos não encontra barreiras para ocorrer (17). Aliás, não só a introdução de novos alimentos, mas o uso de chupeta tem sido relacionado com a menor duração do aleitamento materno. Isso porque, o uso de chupeta reduz o número de mamadas por dia, e consequentemente, haveria uma menor estimulação da mama e menor produção de leite, culminando o desmame. Além disso, pode haver dificuldade de retirar o leite do seio devido à “confusão de sucção” ocasionada pelas diferenças de técnica de sucção da chupeta e do seio (19).
A primeira investigação especificamente delineada para testar essa associação foi realizada em Pelotas, no Sul do Brasil. No estudo, as crianças ainda amamentadas com um mês de idade que usavam chupeta com freqüência tiveram uma chance 2,4 vezes maior de serem desmamadas entre um e seis meses. Esse risco foi menor (1,7 vezes), mas ainda significativo, para as crianças que usavam chupeta menos frequentemente (24).
Tal resultado torna-se preocupante visto que além da amamentação, as chupetas e as mamadeiras, podem prejudicar a função motora oral, exercendo papel importante na síndrome do respirador bucal, promovendo inclusive a ocorrência de problemas ortodônticos provocados pela sucção dos bicos que não estimulam adequadamente os músculos da boca (25).
Estudos realizados no Brasil, também em Pelotas, Rio Grande do Sul, confirmam que algumas recomendações realizadas por pediatras, tais como o uso de água e chás nos primeiros meses de vida, o uso desnecessário de leites artificiais e a introdução precoce de alimentos complementares, representam obstáculo importante à amamentação exclusiva (26).
De certo, as questões apontadas nestes resultados evidenciam outro dado importante. O de que a promoção do aleitamento materno pelos profissionais de saúde não é uma tarefa fácil, natural ou intuitiva (27). Trata-se de uma experiência complexa que envolve uma rede de fatores biológicos, psicológicos e sociais e, também, é mediada pela própria experiência da mulher (28).
Assim o aumento da frequência de mulheres com problemas no início da amamentação pode estar associado também à prática assistencial inadequada (26). Nesse contexto, algumas mulheres relatam insensibilidade dos profissionais de saúde frente à dor não as acolhendo para esse ato. Tal ação por parte desses profissionais de certo promoveu/ ajudou a mulher para o abandono da amamentação (29). Além disso, mostrou que muitos profissionais de saúde que lidam com gestantes, mães e bebês, têm pouco conhecimento em amamentação, bem como habilidades clínicas e de aconselhamento insuficientes para promover, proteger e apoiar o aleitamento materno (26).
DISCUSSÃO
Os resultados desse estudo sugerem que as diferentes condutas dos grupos populacionais em relação à amamentação são moduladas, em sua maioria, por preferências pessoais, culturais, circunstâncias sociais e econômicas, características demográficas e aplicação de programas e ações voltados para evitar o desmame precoce. O Brasil, por ser muito extenso territorialmente, é diversificado em relação aos aspectos mencionados, por isso, as variações de aleitamento natural observadas.
Por esse motivo, é imprescindível conhecer as características locais do padrão de aleitamento natural, afim de avaliar os fatores de risco para o desmame precoce e contribuir para o planejamento em saúde na formulação de ações educativas e de suporte que favoreçam o aumento da prática da amamentação (18).
Consoante, mostra-se importante definir motivos que levaram ao desmame precoce, a fim de proporcionar o maior tempo possível de aleitamento às crianças. Afinal na medida em que conhecemos os motivos que possam contribuir para o desmame precoce, têm-se uma melhor possibilidade de atuar no sentido de prevenir esses fatores de forma mais direcionada e eficaz.
Dentre os principais motivos relacionados ao desmame, observados na literatura pesquisada, podemos citar: uso de chupetas e mamadeiras, “o leite secou” e o “bebê chorava”, “leite materno fraco”, nível socioeconômico, grau de escolaridade da mãe, trabalho materno, incentivo do cônjuge e de parentes e a intenção da mãe de amamentar.
Nesse sentido ainda, verifica-se que o acolhimento deve ser estendido ao núcleo familiar, isso porque, percebe-se que muitos homens apóiam a prática da amamentação com satisfação, enquanto outros têm comportamentos que interferem de forma negativa nesta prática como, ansiedade, ciúme, rejeição, dificuldade sexual, e estas reações podem trazer prejuízos para a duração da amamentação, visto que a mulher passa a se sentir sozinha, sem o apoio do companheiro.
Desta forma também, a insegurança materna decorrente da falta de experiência, tanto pessoal, quanto por observação de outras mulheres amamentando, afirma que suas experiências de certo influenciaram em sua decisão por essa prática e sua manutenção. É importante salientar, no entanto, que embora possa ser uma influência positiva ter visto outras mães amamentarem, ou ter amamentado outro filho com sucesso, há que se considerar que os atos humanos não se constituem em mera repetição. A amamentação é um processo diferente a cada experiência, e por isso precisa ser “aprendido” e “reaprendido” (29).
Tais fatos reforçam a necessidade de apoio, seja de familiar, amigo, ou profissional de saúde para ajudar a mãe a construir competências para cuidar do bebê. Competências essas intimamente relacionadas à própria autoimagem, especialmente se for uma ‘mãe de primeira viagem’ (30).
Assim, para que a prática do AM seja efetivamente estabelecida, além da vontade da mulher, é fundamental que ela esteja inserida em um ambiente favorável e que conte com apoio com todos ao seu redor, inclusive da equipe de saúde, que deve proceder a uma avaliação criteriosa da amamentação, mesmo porque, o período puerperal, por ser considerado um momento delicado, requer atenção e cuidados especiais (18).
Todavia o cenário atual reflete uma preocupação, resultados evidenciam em muitas situações a falta de sensibilidade em acolher a mulher no processo de decisão e adaptação ao AM. É importante lembrar que a assistência parte de um pressuposto de que a amamentação é algo natural, além de um dever. Mas o que normalmente ocorre é a mulher ser reduzida à sua função nutridora, negando-se sua condição de ser humano envolvido no processo (28).
Tal afirmativa requer, portanto um cuidado especial, haja vista que, o tempo de duração da amamentação aumenta quando a mulher recebe aconselhamento em amamentação (31). Mesmo porque, além dessas questões, outros problemas como: mamilos doloridos, fissuras e ingurgitamento mamário são dificuldades que interferem no estabelecimento e sucesso da amamentação (8). Intercorrências dessa natureza evidenciam a necessidade de uma rede de apoio à nutriz, sobretudo nas primeiras semanas após o parto (29).
Ações como a técnica da amamentação são importantes para prevenir dor e traumas mamilares, além disso, a adoção de medidas profiláticas durante o ciclo gravídico-puerperal tende a evitar tais problemas comuns, que além de interferirem na dinâmica de sucção e extração do leite, certamente dificultam o estabelecimento do aleitamento materno (18).
Desta forma, todo profissional que atende mães e bebês, além de conhecer as vantagens da amamentação para a criança e sua mãe, deve ter informação suficiente para fornecer orientação adequada sobre a prevenção e o manejo dos principais problemas que podem ocorrer durante o processo da lactação (ingurgitamento mamário, traumas mamilares, mastites, entre outros) que possam causar sofrimento para a mãe que amamenta e determinar o desmame precoce.
Ainda que a maioria dos livros-textos que abordam esta temática não forneçam as informações necessárias para o manejo adequado dessas situações o profissional de saúde precisa estar preparado para cuidar dessas nutrizes, e isso inclui a habilidade de comunicar-se (28).
Além disso, há algumas intervenções governamentais implantadas nas últimas décadas, como as políticas voltadas para a amamentação veiculadas pela mídia, surgimento da iniciativa Hospital Amigo da Criança, seguindo os “Dez Passos Para o Sucesso da Amamentação”e ainda, planejamento e ações de capacitação de recursos humanos com o respaldo de políticas de proteção. De certo, não se deve negar que há 89 muito que melhorar em relação à prática do aleitamento materno (32).
Mesmo porque, o aleitamento materno não pode ser reduzido a uma ação de saúde, uma vez que é uma prática social que a interpõe “por representações, valores e, inclusive, ideologias e ocorre de modos diferentes, a depender do período histórico e do estrato social considerado” (28:89). É importante que se tenha isto em mente ao se vislumbrarem as metas de promoção do aleitamento materno que o Ministério da Saúde do Brasil preconiza (1).
O profissional de saúde precisa estar preparado, pois por mais competente que ele seja nos aspectos técnicos relacionados à lactação, o seu trabalho de promoção e apoio ao aleitamento materno não será bem sucedido se ele não tiver um olhar atento, abrangente, sempre levando em consideração os aspectos emocionais, a cultura familiar, a rede social de apoio à mulher, entre outros. Esse olhar necessariamente deve reconhecer a mulher como protagonista do seu processo de amamentar, valorizando-a, escutando-a e empoderando-a (1).
Afinal, a amamentação não é um comportamento totalmente instintivo e a técnica em alguns casos precisa ser aprendida. A educação pré-natal, quanto ao aleitamento materno, pode apresentar efeitos benéficos nos seus indicadores, sobretudo nas mulheres primigestas (19). Esse é um dos desafios a serem enfrentados para apoiar o estabelecimento da amamentação e efetivamente contribuir para prolongar a duração do Aleitamento materno exclusivo. Para contemplá-lo recomenda-se o encaminhamento da mãe, após a alta da maternidade, a grupos de apoio ao aleitamento materno (30).
Assim acredita-se que habilidades desempenhadas no pré-natal e puerpério, habilidades de ouvir e aprender aumentam a confiança e promovem apoio, oferecendo ajuda prática além de desenvolver empatia, entre outras (31).
Tais ações nos parecem muito importantes, visto que, a análise dos artigos permitiu conceber a ideia de que ainda são poucos os profissionais de saúde que conhecem e praticam as habilidades de aconselhamento. A falta de conhecimentos e de habilidades no manejo clínico, necessários para dar suporte e apoio às mães, de forma a enfrentar adequadamente as inúmeras situações que se apresentam, em especial nos primeiros dias pós-parto, podem ter influência negativa no estabelecimento e na manutenção do aleitamento materno exclusivo.
Por isso, acredita-se que as gestantes precisam ser encaminhadas a um ambiente favorável à amamentação e contar com o apoio de profissionais habilitados a ajudá-las, para que esta prática se estabeleça com eficiência. Diante disto, para que o início e o estabelecimento do aleitamento materno tenham êxito, as mães necessitam do apoio ativo durante a gravidez e após o parto, não apenas de suas famílias e comunidades, mas também de todo o sistema de saúde, incluindo os profissionais com quem as gestantes e puérperas mantêm contato. Esses por sua vez devem estar comprometidos com a promoção do aleitamento materno e serem capazes de fornecer informações apropriadas, devendo demonstrar habilidades práticas no manejo do aleitamento materno.
Mesmo porque o ato de amamentar é um processo delicado, longo e trabalhoso, pois vai além do fornecimento de alimento. Trata-se da construção de uma nova identidade, enquanto mãe, ou construção da identidade de mãe de um ser humano recém introduzido na dinâmica do grupo familiar.
CONCLUSÕES
Observou-se que há inúmeros fatores que podem contribuir para o sucesso ou fracasso do aleitamento materno. Embora a maioria das mães conheça a importância do leite materno e tenham amamentado seu filho, a média de duração do aleitamento exclusivo observada ainda é menor que o mínimo preconizado pela OMS.
O estabelecimento do aleitamento materno associa-se às experiências vivenciadas pelas mulheres, suas percepções acerca do leite materno e sobre si próprias enquanto nutrizes, além das inseguranças e dificuldades enfrentadas. As pessoas mais experientes, em especial familiares, exercem influência importante nas condutas relacionadas à amamentação. Não basta a mulher querer amamentar, conhecer suas vantagens e duração recomendada, pois, para que essa prática seja efetivamente estabelecida e mantida, ela precisa de apoio e de ser compreendida na particularidade de sua realidade sociocultural.
Nesse contexto, é de fundamental importância que a mulher sinta-se adequadamente assistida nas suas dúvidas e dificuldades, para que as mesmas possam assumir com mais segurança o papel de mãe e provedora do aleitamento de seu filho. Para tanto cabe aos profissionais de saúde à responsabilidade para sensibilizar as gestantes das vantagens dessa prática, visto que é oportunizado um maior contato com as mulheres no período do pré-natal. Portanto, a preparação no ciclo gravídico-puerperal é realizada afim de que ocorra uma amamentação livre de queixas e desenvolva a tomada de consciência dos benefícios trazidos pelo ato de amamentar.
Superar os obstáculos para o aleitamento materno depende da capacidade dos profissionais/ serviços de saúde adequar suas práticas ao contexto sócio-demográfico e epidemiológico atual, otimizando as possibilidades que o modelo assistencial vigente oferece de apoiar efetivamente as mulheres em sua decisão de amamentar seus filhos. É necessário repensar a promoção do aleitamento materno quanto à abordagem das gestantes, despertando nelas o desejo de amamentar por pelo menos dois anos. As intervenções devem ainda propiciar às mães oportunidades de adquirir habilidades práticas para o aleitamento, minimizando as dificuldades iniciais.
Assim, as ações educativas no sentido de preconizar a importância do aleitamento materno deveriam ser enfatizadas com maior vigor e insistência pelos profissionais de saúde, em todos os níveis de atendimento.
Além da vontade materna e da habilidade dos profissionais de saúde em promover o aleitamento da forma acima destacada, é preciso considerar que o sucesso da prática de amamentação depende também de políticas governamentais adequadas e do apoio e participação de toda sociedade.
A partir do diálogo com a literatura, pode-se dizer que falar sobre amamentação requer mais de um encontro, são muitos pontos a serem abordados, por isso é preciso reconhecer que a amamentação adquiriu um perfil social próprio, refletido na criação de mitos e tabus que ainda persistem principalmente nas populações mais carentes e que para uma mudança de hábitos sociais tornam-se necessários tempo e persistência.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS