Rev Cuid. 2023; 14(1): e2354
http://dx.doi.org/10.15649/cuidarte.2354

RESEARCH ARTICLE

 

Construção e validação de jogo educativo sobre sexualidade para adolescentes

 

Construction and validation of an educational game about sexuality for adolescents

 

Construcción y validación de un juego educativo sobre sexualidad para adolescentes

 

 

 

Nadyelle Elias Santos Alencar1 Maria Aparecida Oliveira Pinto2 Nicácio Torres Leite3 Claudia Maria Vieira da Silva4

 

    1. Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão, Pedreiras, MA, Brasil. E-mail: esanttana42@gmail.com Autor de correspondência
    2. Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão, Pedreiras, MA, Brasil. E-mail: marcondes.lari@gmail.com
    3. Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão, Pedreiras, MA, Brasil. E-mail: aas.luana@gmail.com
    4. Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão, Pedreiras, MA, Brasil. E-mail: namie.sawada@unifal-mg.edu.br

 

    Highlights:

    • Objetiva-se a construção e validação de uma tecnologia educacional, do tipo jogo de tabuleiro, para mediar a discussão da sexualidade com a população adolescente.

    • A dinâmica do jogo Match envolve perguntas e respostas, no qual o objetivo do jogador é acertar as perguntas temáticas, percorrer o trajeto, e chegar primeiro ao final do tabuleiro.

    • Segundo os juízes, o jogo demonstra pertinência prática, conteúdo abrangente e está adequado à população-alvo, sendo relevante para a prática profissional.

    • Apesar de estar validado quanto ao conteúdo e aparência, a avaliação do efeito do jogo no conhecimento, atitudes e intenções dos adolescentes precisa ser foco de futuras investigações.

 


    Como citar este artigo: Alencar, Nadyelle Elias Santos; Pinto, Maria Aparecida Oliveira; Leite, Nicácio Torres; Silva, Claudia Maria Vieira da.  Construção e validação de jogo educativo sobre sexualidade para adolescentes. Revista Cuidarte. 2023;14(1):e2354. http://dx.doi.org/10.15649/cuidarte.2354

    Recebido: 12 de agosto de 2021
    Aceito:
    2 de dezembro de 2022
    Publicado:
    24 de fevreiro de 2023

     

    E-ISSN: 2346-3414


 

Resumo

 

Introdução: a educação em saúde de adolescentes com foco na sexualidade é favorecida pelo emprego de tecnologias cuidativo-educacionais. Objetivo: construir e validar uma tecnologia educacional, do tipo jogo de tabuleiro, para mediar a discussão de tópicos referentes à sexualidade com a população adolescente.  Materiais e métodos: estudo metodológico delineado em três etapas, a saber: 1º) delimitação do conteúdo a ser abordado, 2º) elaboração do protótipo do jogo, 3º) validação do conteúdo e aparência por juízes especialistas. Resultados e discussão: “Match” é um jogo de tabuleiro, com perguntas temáticas relacionados à sexualidade que direcionam o jogador do início ao fim do trajeto. Deu-se ênfase à incorporação de elementos da gamificação, tais como, sorte, estratégia, competição e cooperação. O processo de validação obteve êxito em todas as categorias avaliadas, o jogo foi considerado relevante e adequado às atividades de educação em saúde. Conclusões: O jogo elaborado encontra-se validado e disponível à comunidade científica e profissional, e deverá ter os seus efeitos mensurados nas próximas etapas da pesquisa. Além disso, uma versão digital da ferramenta deve ser construída para elevar o seu alcance.

Palavras-Chave: Tecnologia Educacional; Sexualidade; Adolescente.

 


Abstract

 

Introduction: health education for adolescents with a focus on sexuality is favored using care-educational technologies. Objective: to build and validate an educational technology, like a board game, to mediate the discussion of topics related to sexuality with the adolescent population. Materials and methods: methodological study outlined in three stages, namely: 1st) delimitation of the content to be addressed, 2nd) creation of the game prototype, 3rd) validation of the content and appearance by expert judges. Results and discussion: “Match” is a board game, with thematic questions related to sexuality that direct the player from the beginning to the end of the path. Emphasis was placed on the incorporation of gamification elements, such as luck, strategy, competition, and cooperation. The validation process was successful in all evaluated categories, the game was considered relevant and suitable for health education activities. Conclusions: The developed game is validated and available to the scientific and professional community, and its effects should be measured in the next stages of the research. In addition, a digital version of the tool must be built to increase its reach.

KeyWords: Educational Technology; Sexuality; Adolescent


Resumen

 

Introducción: la educación en salud de los adolescentes con enfoque en la sexualidad se ve favorecida por el uso de tecnologías cuidado - educativas. Objetivo: construir y validar una tecnología educativa, a modo de juego de mesa, para mediar en la discusión de temas relacionados a la sexualidad con la población adolescente. Materiales y métodos: estudio metodológico planteado en tres etapas, a saber: 1ª) delimitación del contenido a abordar, 2ª) creación del prototipo del juego, 3ª) validación del contenido y apariencia por jueces expertos. Resultados y discusión: “Match” es un juego de mesa, con preguntas temáticas relacionadas con la sexualidad que dirigen al jugador desde el principio hasta el final del viaje. Se hizo hincapié en la incorporación de elementos de gamificación, como la suerte, la estrategia, la competencia y la cooperación. El proceso de validación fue exitoso en todas las categorías evaluadas, el juego fue considerado relevante y adecuado para actividades de educación en salud. Conclusiones: el juego desarrollado está validado y disponible para la comunidad científica y profesional, y sus efectos deben medirse en las próximas etapas de la investigación. Además, se debe construir una versión digital de la herramienta para aumentar su alcance.

Palabras Clave: Tecnología Educacional; Sexualidad; Adolescente


 

Introdução 

A sexualidade, enquanto construção evolutiva da espécie humana, resulta de um processo social, histórico e cultural únicos. Para além das especificidades biológicas com fins reprodutivos, a sexualidade revela-se nas entrelinhas das relações humanas em busca dos prazeres do corpo, sendo, por tal razão, frequentemente associada à perversão, pecado ou atentado ao pudor. O moralismo e os tabus relacionados ao assunto dificultam a sua plena discussão, corroboram para o não entendimento de aspectos fundamentais da vida sexual humana e inibem o exercício saudável da sexualidade1.

Na adolescência, fase de transição dos 10 aos 19 anos de idade, o amadurecimento sexual marca o início de intensas transformações de ordem física, psíquica e social2. Nesse período de descobertas, ao passo em que os riscos e as vulnerabilidades se aguçam, há poucas oportunidades para a conscientização sobre saúde sexual e reprodutiva3. A carência de espaços para o debate impele à busca desordenada por informações, por vezes distorcidas ou inadequadas, sobretudo por meio da internet, capazes de impactar negativamente os comportamentos adolescentes4.

Ressalta-se que por se tratar de um grupo populacional marcado por questões de saúde específicas, os adolescentes carecem de políticas públicas que atendam às demandas próprias da fase. Nesse contexto, as ações de educação em saúde devem orientar a mudança de comportamento, a redução das vulnerabilidades e a minimização dos riscos, por meio de estratégias inovadoras e atrativas, que permitam maior aceitação e eficácia, a exemplo das tecnologias cuidativo-educacionais5.

No rol de tecnologias para fins de saúde, um estudo de revisão que mapeou as publicações ocorridas entre os anos de 1985 e 2018, revelou concentração nos continentes americano e europeu e crescimento acentuado no número de publicações a partir de 2011. Assinala-se que, dentre as temáticas-base, dos 161 artigos incluídos, 65 eram dedicados à população de até 18 anos de idade e apenas seis tinham como foco a sexualidade6.

De modo mais específico, sobre jogos educativos com ênfase na sexualidade, publicados até julho de 2013, uma revisão sistemática destacou a carência de opções tecnológicas em países menos desenvolvidos e a concentração massiva de estudos norte-americanos, seis dos sete estudos identificados7. Na literatura recente, evidências apontam que os jogos educativos sobre sexualidade são bem aceitos pela população adolescente, sendo também bem vistos pela família4. Além disso, auxiliam a aquisição de conhecimento e promovem a mudança de atitudes relacionadas à sexualidade8,9. Por outro lado, salientam a necessidade de aprofundamento investigativo acerca do efeito dos jogos, com foco em estudos metodológicos mais robustos7,10.

Com base no exposto, objetiva-se a construção e validação de uma tecnologia educacional, do tipo jogo de tabuleiro, para mediar a discussão da sexualidade com a população adolescente.

Materiais e Métodos

Tipo de Estudo

Estudo metodológico sobre a construção e validação de uma tecnologia cuidativo-educacional, do tipo jogo de tabuleiro, sobre sexualidade na adolescência.

Local de Estudo

O estudo foi desenvolvido por pesquisadores vinculados ao Instituto Federal do Maranhão, Campus Pedreiras; e ao Grupo de Estudos e Pesquisas em Inovação, Saúde e Sociedade - GEPISS, certificado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ) em 2020.

Participantes do Estudo

A equipe de desenvolvimento da ferramenta envolveu duas pesquisadoras da área da saúde, uma enfermeira e uma profissional da educação física, e dois estudantes adolescentes.

Em relação ao grupo de especialistas, responsáveis pela validação da ferramenta, foi composto por nove profissionais com expertise na temática-foco.

Procedimentos metodológicos para a elaboração e validação do jogo educativo

A elaboração do jogo seguiu três etapas metodológicas. Inicialmente, foi delimitado o conteúdo da tecnologia a ser construída. Por entender a amplitude da temática sexualidade, procurou-se demarcar a abordagem para além das questões biologicistas, dando lugar às vivências adolescentes. Para isso, foi realizado um levantamento da literatura, a partir dos manuais, cartilhas e outros documentos oficiais publicados por Instituições nacionais e internacionais, com notória representatividade acerca da temática, tais como: Ministério da Saúde, Organização Panamericana da Saúde e Organização das Nações Unidas.

Na segunda etapa, foi elaborado o protótipo do jogo, com auxílio de uma ferramenta de design online e gratuita. A construção da tecnologia educativa deu-se através da adaptação de do jogo de tabuleiro “Cuca Legal", que envolve um quiz de perguntas e respostas sobre diferentes temas e direciona o jogador do início ao fim de um trajeto11. Nessa fase, foram definidos a apresentação identitária do jogo (nome e design) e o conteúdo (perguntas, regras do jogo e manual do aplicador).

Na última etapa, ocorreu a validação do jogo por especialistas, segundo o conteúdo (objetivo, conteúdo e relevância) e a aparência (design, clareza e organização). O formulário de validação foi adaptado do proposto por Sousa e colaboradores12. Os especialistas julgaram os itens com as seguintes respostas: 0-discordo totalmente; 1-discordo parcialmente; 2-não discordo, nem concordo; 3-concordo parcialmente; 4-concordo totalmente. Além disso, os profissionais fizeram comentários e sugestões sobre as dimensões avaliadas.

O comitê foi composto por nove especialistas5. A escolha dos especialistas teve como critérios a formação e a experiência profissional. Foram incluídos profissionais com escore igual ou superior a cinco pontos, segundo os critérios, somados cumulativamente: doutorado na área da saúde (4 pontos), mestrado na área da saúde (3 pontos), doutorado/mestrado sobre saúde do adolescente, educação em saúde, tecnologia educativa e/ou validação (2 pontos), atuação mínima de um ano em saúde do adolescente ou educação em saúde (2 pontos), cursos de capacitação/especialização em saúde do adolescente ou educação em saúde (2 pontos).

Os juízes foram contactados por email e convidados a participar da validação. Aqueles que aceitaram, receberam uma versão digitalizada do jogo (conteúdo e regras para uso), juntamente com o termo de consentimento livre e esclarecido, o formulário para caracterização do perfil dos juízes e o instrumento para validação da ferramenta, no prazo de 21 dias.

Procedimentos de análise e tratamento dos dados

Para determinar a concordância entre as respostas dos juízes foi calculado o Índice de Validade de Conteúdo (IVC) para cada item avaliado (número de respostas “3” ou “4” / número total de respostas), com ponto de corte de 0,8. Os dados foram organizados e processados por meio do Microsoft Excel, e armazenados no Mendeley Data13.

Aspectos éticos

O projeto foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa, respeitando os preceitos da Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde, e obteve aprovação pelo Comitê do Instituto Federal do Piauí, parecer nº 4.464.169.

Resultados 

A tecnologia cuidativo-educacional

O jogo de tabuleiro recebeu o nome “Match - Discutindo Sexualidade na Adolescência”. A seguir serão detalhados os componentes e as regras que orientam o uso da tecnologia construída. Em relação aos seus componentes, contém: um tabuleiro, um guia com as regras, seis peões, um dado e 40 cartas (cada carta possui nove perguntas temáticas). Os temas trabalhados são representados por cores e símbolos e abordam conteúdos relacionados à educação sexual na adolescência, são eles: adolescência, sexualidade, relacionamentos, questões de gênero, prevenção, métodos contraceptivos e infecções sexualmente transmissíveis (IST) (Figura1).

Em relação às perguntas temáticas, optou-se por incluir questões abertas, de múltipla escolha, verdadeiro ou falso, além de situações-problema.

 

 

Figura 1. Tabuleiro do jogo “Match - Discutindo Sexualidade na Adolescência”. Pedreiras, Maranhão, Brasil, 2021.

 

Para a jogabilidade, são necessários de dois a seis participantes (ou grupos de participantes). A aplicação deve ser orientada preferencialmente por um profissional da saúde. Foi elaborado um manual de apoio ao profissional que contém todas as perguntas e respostas do jogo, fornece dicas para leitura complementar e fotos de apoio para facilitar a discussão das temáticas durante o jogo.

A dinâmica do jogo Match envolve perguntas e respostas, no qual o objetivo do jogador é acertar as perguntas temáticas, percorrer o trajeto, e chegar primeiro ao final do tabuleiro. O progresso no jogo é percebido quando o jogador acerta o maior número de perguntas, avança as casas do tabuleiro e mantém-se à frente dos demais competidores.

No que tange à mecânica, o jogador que inicia a partida lança o dado e, de acordo com o número obtido, alcançará uma casa temática do tabuleiro. Em seguida, deve buscar uma carta no monte e responder à questão correspondente. Caso erre, deverá retornar à posição anterior. Se acertar, permanece na casa e passa a vez para o jogador seguinte. Assim acontece o jogo, até que um dos jogadores alcance o final.

Sobre algumas estratégias de gamificação incorporadas ao jogo, destacam-se a sorte, a estratégia, a competição e a cooperação. A sorte acontece essencialmente através do uso do dado que define quantas casas devem ser percorridas. A estratégia é evidenciada pela regra do “não sei”, na qual o jogador pode abster-se de responder a questão quando não sentir segurança, em apenas duas oportunidades durante a partida, estimulando a tomada de decisão do jogador.

Além disso, a relação dos jogadores é evidenciada de duas formas: a competição se dá naturalmente pelo desejo de ganhar chegando primeiro à última casa do jogo e a cooperação ocorre quando o jogo é disputado entre grupos de jogadores, e a resposta à pergunta deve ser definida em consenso pelos integrantes do grupo.

 

A validação da tecnologia cuidativo-educacional

Nove juízes especialistas participaram do processo de validação, seis deles do sexo feminino, com idade entre 28 e 40 anos e renda mensal maior que 4 Salários Mínimos (SM). Todos eram enfermeiros, com formação específica em diversas áreas, tais como saúde da família, saúde da mulher, epidemiologia e saúde mental (Tabela1).

 

Tabela 1. Caracterização dos juízes especialistas.  Pedreiras, Maranhão, Brasil, 2021.

 

 

Sexo

Idade

RMM

Profissão

Formação

Tempo de atuação
(saúde do adolescente)

Juiz 1 Femenino 31 >6 a 8 SM Enfermeiro Especialização em Saúde da Família e Enfermagem do trabalho 6
Juiz 2 Masculino 30 >4 a 6 SM Enfermeiro Especialização em Atenção Básica e Saúde da Família 1
Juiz 3 Feminino 29 > 10 SM Enfermeiro Especialização 6
Juiz 4 Feminino 28 >4 a 6 SM Enfermeiro Especialização em Enfermagem do Trabalho e Saúde Mental 6
Juiz 5 Masculino 38 >6 a 8 SM Enfermeiro Especialização em Saúde da Mulher Negra 6
Juiz 6 Masculino 33 >6 a 8 SM Enfermeiro Mestrado em Epidemiologia 5
Juiz 7 Feminino 31 > 10 SM Enfermeiro Especialização em Enfermagem obstétrica e neonatal 6
Juiz 8 Feminino 40 >4 a 6 SM Enfermeiro Residência em Enfermagem Obstétrica 6
Juiz 9 Feminino 34 >6 a 8 SM Enfermeiro Especialização em Enfermagem do trabalho 6

Legenda: RMM - renda média mensal; SM - salário mínimo (1SM= 1.045,00).

 

A Tabela2 apresenta a validação do jogo Match quanto às dimensões: objetivos, conteúdo e relevância. Além da distribuição dos profissionais segundo a resposta fornecida, foi calculado o IVC, geral e por item, para avaliar a concordância entre eles. Em relação às três dimensões mencionadas, obteve-se IVC máximo (1,0).

 

Tabela 2. Avaliação dos objetivos, conteúdo e relevância do jogo Match segundo o Índice de Validade de Conteúdo. Pedreiras, Maranhão, Brasil, 2021.

 

DT

DP

NDNC

CP

CT

IVC

Objetivos

O jogo atende aos objetivos propostos?

O jogo permite a discussão sobre temas    relacionados à sexualidade na adolescência?

O jogo é adequado para a utilização por profissionais que trabalham com adolescentes?

Conteúdo

O conteúdo é adequado à temática?

O conteúdo é adequado ao público?

O conteúdo é completo e abrangente?

As informações apresentadas são corretas?

Relevância

O jogo favorece a educação em saúde de adolescentes?

O jogo é relevante para a prática profissional?

O jogo contribui para a construção de conhecimentos sobre a temática?

Geral

 

-

-

-

 

-

-

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-

 

-

-

-

-

 

-

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-

 

-

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-

 

-

-

-

 

-

-

-

-

 

-

-

-

-

 

-

-

-

 

-

1

1

-

 

-

2

-

4

 

9

9

9

 

9

8

8

9

 

9

7

9

86

 

1,0

1,0

1,0

 

1,0

1,0

1,0

1,0

 

1,0

1,0

1,0

1,0

Legenda: DT- discordo totalmente, DP - discordo parcialmente, NDNC - não discordo, nem concordo, CP - concordo parcialmente, CT - concordo totalmente, IVC - índice de validade de conteúdo.

 

A validação da clareza, organização e design está demonstrada na Tabela3. Nenhum dos itens gerou discordância entre os juízes, entretanto, aqueles relacionados ao design tiveram um IVC abaixo das demais dimensões avaliadas. Vale ressaltar que todos os itens tiveram avaliação satisfatória, superando o valor mínimo de concordância de 0,8.

 

Tabela 3. Avaliação da clareza, organização e design do jogo Match segundo o índice de Validade de Conteúdo. Pedreiras, Maranhão, Brasil, 2021.

 

DT

DP

NDNC

CP

CT

IVC

Clareza e Organização

As regras são claras e de fácil entendimento?

O material utilizado está apropriado?

O conteúdo das cartas é adequado?

Design

O design das cartas é adequado?

A fonte dos textos (títulos e corpo do texto) é adequada?

A redação e o vocabulário são acessíveis ao público-alvo?

Geral

 

-

-

-

 

-

-

-

-

 

-

-

-

 

-

-

-

-

 

-

-

-

 

1

1

-

2

 

3

1

0

 

-

1

1

6

 

6

8

9

 

8

7

8

46

 

1,0

1,0

1,0

 

0,89

0,89

1,0

0,96

Legenda: DT- discordo totalmente, DP - discordo parcialmente, NDNC - não discordo, nem concordo, CP - concordo parcialmente, CT - concordo totalmente, IVC - índice de validade de conteúdo.

Além do julgamento dos itens, os juízes fizeram sugestões e comentários. O juiz 9 afirmou que o jogo será de grande relevância para estimular o interesse e a aprendizagem. Sobre o modo como a temática foi trabalhada, o juiz 7 enalteceu o conteúdo do material de apoio ao profissional e salientou que o uso de perguntas com casos-problema é uma importante estratégia para a discussão das situações cotidianas com os jovens.

Em relação ao design, o juiz 3 sugeriu o uso de tons mais claros nas cartas para facilitar a leitura dos textos, além do uso de vocábulos mais informais em algumas das perguntas do jogo. No mesmo sentido, o juiz 8 propôs a inclusão/substituição de alguns vocábulos para a melhor compreensão pelo público-alvo, a exemplo da incorporação do termo “pílula do dia seguinte” como sinônimo de “anticoncepcional de emergência”. Conforme as sugestões dos juízes, o modelo das cartas foi alterado (Figura2).

 

Figura 2. Modelo das cartas do jogo “Match - Discutindo Sexualidade na Adolescência” com perguntas temáticas, antes e após o processo de validação. Pedreiras, Maranhão, Brasil, 2021.

 

Tal como o design, os avaliadores sugeriram mudanças em algumas regras do jogo, foram elas: uso da sorte para iniciar a partida, antes o jogador mais novo iniciava; agora, inicia aquele que alcançar o maior número ao lançar o dado. Também foi alterada a regra que permitia ao adolescente jogar novamente caso tirasse um número par e acertasse a questão correspondente à casa do tabuleiro; agora, terá direito a jogar novamente, o jogador que adivinhar o número que alcançará no dado e acertar a pergunta.

Discussão 

O presente estudo apresenta e disponibiliza à comunidade científica brasileira um jogo factível de ser incorporado aos programas de educação em saúde, junto à população adolescente. O jogo "Match - Discutindo Sexualidade na Adolescência", validado por especialistas, inova ao abordar diversas temáticas no escopo da sexualidade, possibilitando a discussão ampliada sobre o assunto, além de permitir diferentes experiências a cada partida.

No processo de validação, o jogo revelou resultados satisfatórios em todas as categorias avaliadas. Os juízes apresentaram avaliação entusiasmada, inclusive apontando a relevância e aplicabilidade prática. Ressalta-se a importância do processo de validação para o refinamento, ajustes e adequação da ferramenta, quanto à forma e conteúdo, como etapa prévia à disponibilização para uso.

A população adolescente, direcionada pela curiosidade e impulsividade próprias da fase, encontra-se suscetível a comportamentos de risco que os expõem a eventos perturbadores do ciclo natural de desenvolvimento, a exemplo da elevada incidência de IST14 e gravidez na adolescência15.

Ressalta-se que, além dos cuidados triviais com o corpo e do estímulo ao sexo seguro, defende-se que a educação sexual impulsione a autonomia e conscientize essa população acerca dos riscos e repercussões relacionados às vivências sexuais. Mais especificamente, convém a ampliação do debate e a inclusão de temas, tais como: relacionamentos violentos, abuso sexual, questões de gênero e identidade sexual, com foco na quebra do ciclo da violência e prevenção do preconceito3.

A despeito da relevância, o uso de jogos para a educação sexual de adolescentes ainda é discreto. Uma revisão sistemática das publicações sobre o tema, ocorridas até 2013, identificou apenas sete estudos, e nenhum deles tinha como foco a população brasileira. De modo geral, demonstrou-se que os jogos apresentam efeitos positivos, embora haja necessidade de avaliação mais robusta sobre os seus impactos a longo prazo, com ênfase em desenhos metodológicos rigorosos, a exemplo dos ensaios controlados e aleatorizados7. As publicações nacionais sobre o tema são recentes, com destaque: “Papo Reto”, jogo online que discute sexualidade e relações de gênero16, “DECIDIX”, jogo digital sobre relações afetivas e sexuais17, “Contando bem que mal tem?”, jogo de cartas que debate corporalidade, relacionamentos, IST e métodos contraceptivos12, e “A aventura do adolescente com Transtorno do Espectro Autista (TEA)”, jogo de tabuleiro para a educação sexual de adolescentes com TEA18.

Dentre os estudos brasileiros, observa-se a carência de investigações que avaliem efetivamente o efeito das ferramentas educativas. Entretanto, resultados preliminares apontam que os jogos são benéficos12, auxiliam o ganho de conhecimento15, estimulam a autonomia e o compartilhamento de experiências17.

Os dados nacionais harmonizam com a realidade internacional. O jogo para computador “My Future Begins Today”, por exemplo, trata sobre saúde sexual de adolescentes em áreas com baixo acesso à tecnologia na África Subsariana, e revelou que o jogo foi capaz de incitar a mudança de atitude e promover práticas sexuais seguras9. Outro exemplo é o jogo de smartphone “Tumaini”, como foco na prevenção do Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV) entre jovens africanos, que, ao discutir situações da vida real, propicia o pensamento crítico, estimula a tomada de decisão e a solução de problemas, criando o senso de responsabilidade10.

Além disso, os jogos demonstram ser compatíveis aos interesses dos adolescentes e geram elevado engajamento19. O jogo “Sexpert High School” expôs benefícios à educação sexual de adolescentes latinos e evidenciou sua elevada viabilidade e aceitabilidade8. Na mesma perspectiva, o jogo para tablet “My Future Family”, que aborda temas relacionados à puberdade, saúde sexual e reprodutiva e contracepção, também demonstrou boa aceitação pelos adolescentes. A maioria dos alunos gostou do jogo, o recomendaria a um amigo e acredita que favoreceu o ganho de conhecimento4.

Contrapondo os bons resultados até aqui apresentados, o jogo de cartas “InFection Four” não obteve avaliação satisfatória, apenas 27% dos participantes afirmou ter aprendido com o jogo e 26% disse não ter aprendido nada. Cabe ressaltar que esses resultados têm relação com a narrativa fictícia adotada pelo jogo, uma vez que, os estudantes preferem conteúdos e abordagens que envolvam situações cotidianas reais20.

Considerando o exposto, ressalta-se que as atividades educativas, quando adequadas à realidade do adolescente, favorecem a construção de conhecimento e a redução das vulnerabilidades observadas, sendo os jogos estratégias facilitadores nesse processo21. Isso ocorre porque os jogos educativos apresentam valor educacional sem deixar de lado o entretenimento. Atuam como mediadores do processo de aprendizagem, permitem a discussão de temas tabus e promovem experiências ricas e engajadoras, demonstrando adequação às ações de promoção da saúde19.

Não obstante, é essencial reconhecer as limitações do presente estudo e indicar as próximas etapas a serem empregadas. Apesar de estar validado quanto ao conteúdo e aparência, a avaliação do efeito do jogo no conhecimento, atitudes e intenções dos adolescentes precisa ser foco de futuras investigações. Sugere-se ainda que a avaliação ocorra com amostras representativas, envolvendo ambos os sexos, faixa etária abrangente e características socioculturais diversas. Outro direcionamento deve ser a construção de uma versão digital do jogo, corroborando para a maior acessibilidade em relação ao tempo e espaço.

 

Conclusão

O presente estudo elaborou e validou um jogo educativo, do tipo tabuleiro, intitulado "Match - Discutindo Sexualidade na Adolescência". Integra um grupo restrito de estudos sobre a temática na realidade brasileira, sendo uma opção viável e validada, em condições adequadas para o uso enquanto ferramenta educacional. Segundo os juízes, o jogo demonstra pertinência prática, conteúdo abrangente e está adequado à população-alvo, sendo relevante para a prática profissional. Em relação à aparência, regras e linguagem, alguns ajustes foram feitos de modo a atender às sugestões dos profissionais especialistas na área. Por fim, convém ressaltar a importância das etapas seguintes para avaliação do efeito do jogo no conhecimento, nas tomadas de decisões e nas intenções dos jovens, como também a construção de uma versão digital da ferramenta, de forma a torná-la mais acessível.

Conflito de interesse: Nada a declarar.

Agradecimento: Agradecemos ao Instituto Federal do Maranhão pela concessão de auxílio financeiro, em convênio com o CNPq, no âmbito do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC, e ao Grupo de Estudos e Pesquisas em Inovação, Saúde e Sociedade (GEPISS) pelo apoio.

 

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