VOL. 10 Nº 3 SEPTIEMBRE – DICIEMBRE 2019 BUCARAMANGA, COLOMBIA
E-ISSN: 2346-3414

Rev Cuid. 2019; 10(3): e624
http://dx.doi.org/10.15649/cuidarte.v10i3.624

ARTÍCULO DE REVISIÓN

Empatia no processo de cuidado em enfermagem sob a ótica da teoria do reconhecimento: síntese reflexiva

Empathy in the nursing care process under the recognition theory approach: a reflective synthesis

Empatía en el proceso de cuidado en enfermería bajo la óptica de la teoría del reconocimiento: síntesis reflexiva

Milena Amorin Zuchetto1, Franciely Daiana Engel2, Luciano Silveira Pacheco de Medeiros3, Karina Silveira de Almeida Hammerschmidt4, Soraia Dornelles Schoeller5

1Universidade Federal de Santa Catarina, Departamento de Enfermagem, Programa de Pós-graduação em Enfermagem. Florianópolis, Brasil. Autor de Correspondência. E-mail: milenazuchetto3@gmail.com https://orcid.org/0000-0002-6042-8733
2Universidade Federal de Santa Catarina, Departamento de Enfermagem, Programa de Pós-graduação em Enfermagem. Florianópolis, Brasil. E-mail: francy.d15@hotmail.com https://orcid.org/0000-0002-2376-4164
3Universidade Federal de Santa Catarina, Departamento de Enfermagem. Florianópolis, Brasil. E-mail: lucianospm@outlook.com https://orcid.org/0000-0002-9679-3134
4Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, Brasil. E-mail: karina.h@ufsc.br https://orcid.org/0000-0002-7140-3427
5Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, Brasil. E-mail: soraia.dornelles@ufsc.br https://orcid.org/0000-0002-2822-4407

Histórico
Recebido: 15 de octubre de 2018
Aceitado: 14 de agosto de 2019

Como citar este artigo: Zuchetto M, Engel F, Medeiros L, Hammerschmidt K, Schoeller S. Empatia no processo de cuidado em enfermagem sob a ótica da teoria do reonhecimento: síntese reflexiva. Rev Cuid. 2019; 10(3): e624. http://dx.doi.org/10.15649/cuidarte.v10i3.624

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Resumo

Introdução: A integração humanística-científica entre conhecimento cientifico e práticas em saúde visam a promoção do cuidado na ótica construtiva do processo de ajuda - mútua e de confiança focada na efetividade do cuidado. A essência do cuidado em Enfermagem é fundamentada nas relações de confiança e vínculo entre enfermeiro e pessoa cuidada, nesta lógica, a empatia surge como o entrelaçar das relações recíprocas de cuidado. Materiais e Métodos: Trata-se de um estudo reflexivo que objetivou discutir o cuidado realizado por profissionais de enfermagem através da empatia à luz da Teoria do Reconhecimento. Resultados: O cruzamento dos dados foi trabalhado em um eixo filosófico central e duas categorias caracterizadoras: empatia na contemporaneidade e a enfermagem como ciência do cuidado, buscando captar a essência do reconhecimento neste processo dialógico e recíproco. Discussão: A empatia, compreendida no processo de cuidado em enfermagem é vista na literatura como uma construção processual e relacional entre o profissional e a pessoa, buscando estabelecer interdependências com confiança mútua e recíproca. O reconhecimento do outro através da empatia é necessária para a construção de uma relação de afeto e estima, visando ter relações de confiança e reciprocidade. Conclusões: A empatia é construída no cuidado em enfermagem através da valorização íntima e individual dos envolvidos, por meio do respeito, dignidade, civilidade, compaixão e superação das diferenças.

Palavra chave: Cuidados de Enfermagem; Empatia.


Abstract

Introduction: The humanistic and scientific integration between scientific knowledge and healthcare practices is intended to promote care within the constructive perspective of the mutual-aid and trust process, focusing on the effectiveness of care. The essence of nursing care is based on trust relationships and the link between the nurse and the person in care; empathy emerges within this logic as the tie that binds the mutual relations of care. Materials and Methods: This is a reflective study intended to discuss the care provided by nursing professionals through empathy, in the light of the Recognition Theory. Results: Data crossing was performed by means of a philosophical central concept and two characterizing categories: Empathy in contemporaneity and nursing as a science of care. The aim was to capture the essence of the recognition in this dialogic and reciprocal process. Discussion: The literature shows empathy –within the nursing care process– as a procedural and relational construction between the professional and the person that seeks to establish interdependencies under mutual and reciprocal trust. Recognizing the other through empathy is a necessary step to build up a relation of affection and esteem, aiming at establishing relations of trust and reciprocity. Conclusions: Empathy is developed in nursing care through the intimate and individual recognition of those involved, by means of respect, dignity, civism, compassion, and overcoming differences.

Key words: Nursing Care; Empathy.


Resumen

Introducción: La integración humanística-científica entre conocimiento científico y prácticas en salud tienen por objeto promover el cuidado dentro de la perspectiva constructiva del proceso de ayuda mutua y de confianza enfocada en la efectividad del cuidado. La esencia del cuidado en Enfermería se fundamenta en las relaciones de confianza y el vínculo entre enfermero y persona cuidada, dentro de esta lógica surge la empatía como el lazo que une las relaciones recíprocas de cuidado. Materiales y Métodos: Se trata de un estudio reflexivo cuyo objetivo era discutir sobre el cuidado realizado por profesionales de enfermería a través de la empatía a la luz de la Teoría del Reconocimiento. Resultados: El cruce de los datos se hizo a través de un eje filosófico central y dos categorías caracterizadoras: empatía en la contemporaneidad y la enfermería como ciencia del cuidado, buscando captar la esencia del reconocimiento en este proceso dialógico y recíproco. Discusión: En la literatura, la empatía, comprendida en el proceso de cuidado en enfermería, aparece como una construcción procesal y relacional entre el profesional y la persona, buscando establecer interdependencias con confianza mutua y recíproca. El reconocimiento del otro a través de la empatía es necesario para construir una relación de afecto y estima, con miras a tener relaciones de confianza y reciprocidad. Conclusiones: La empatía se construye en el cuidado de enfermería a través de la valorización íntima e individual de los involucrados, por medio del respeto, dignidad, civismo, compasión y superación de las diferencias.

Palabra clave: Atención de Enfermería; Empatía.


INTRODUÇÃO

Almeja-se a compreensão dos eixos humanístico-científicos inerentes à Enfermagem em virtude da preocupação com o delineamento sobre a essência do cuidado. Em tempos remotos, muito questionou-se acerca da Enfermagem ser considerada profissão ou meramente ocupação, haja visto que os serviços prestados pelos Enfermeiros eram percebidos como simples extensão daqueles prestados pelas mães e pelas esposas1.

Nesse contexto o que se percebe é a retomada de preceitos humanísticos para a profissão, considerando a cientificidade e lutas de valorização da profissão enquanto ciência própria2. Conforme autores, as profissões são valorizadas pela sociedade porque os serviços que os profissionais executam são benéficos aos seus membros. As características de uma profissão incluem (1) uma base definida e especializada de conhecimento; (2) controle e autoridade sobre o treinamento e o ensino; (3) sistema de credenciamento ou registro de modo a assegurar a competência; (4) serviço altruísta para a sociedade; (5) código de ética; (6) educação formal em instituições de ensino superior; (7) socialização prolongada à profissão e (8) autonomia1,2.

Porém, muito mais do que competências técnicas, o exercício da profissão de enfermagem é desafiador, ao passo que é necessário empatia transpassada por eixos emocionais, psíquicos, culturais e sociais que influem na expressão da liberdade e dignidade humana. Esses eixos são debatidos na teoria sociológica como elementos construtivos do reconhecimento, o qual se fundamenta em dispositivos de proteção intersubjetivos, respeitosos e públicos, que fomentam a formação da personalidade bem-sucedida do sujeito3.

O processo de ação libertadora depende do estabelecimento de relações recíprocas, mútuas e igualitárias no meio social, visando a efetiva a integração humanística-científica. Dessa forma, é urgente a conjugação e harmonia entre conhecimento cientifico e prática de comportamento, visando a promoção do cuidado para a saúde do ser humano4. Dentre os fatores influenciadores deste processo de construção do equilíbrio, encontra-se a relação de ajuda-confiança focado e determinado para uma ajuda efetiva5. Buscando compreender os atravessamentos do cuidado, da enfermagem e da empatia, o presente estudo buscou discutir o cuidado realizado por profissionais de enfermagem através da empatia à luz da Teoria do Reconhecimento de Axel Honneth.

MATERIAIS E MÉTODOS

Este trabalho originou de provocações realizadas na disciplina eletiva “Envelhecimento Humano e Deficiência”, a qual foi ofertada por um programa de Pós-Graduação em Enfermagem em uma universidade federal do sul do Brasil. Os acadêmicos que optaram por essa disciplina foram instigados a reflexões acerca da temática, sendo que rodas de discussão basearam a metodologia aplicada em sala de aula para construção do conhecimento.

Para completar etapa avaliativa da disciplina, o grupo teve como desafio elaborar este trabalho crítico-reflexivo, que parte de uma das rodas de discussões realizadas durante as aulas. As conversas foram guiadas a partir de questionamentos para a turma, os quais geraram calorosas argumentações. O processo crítico-reflexivo teve como olhar profundo e filosófico a Teoria do Reconhecimento de Axel Honneth.

Diante disso, este trabalho contém reflexões acerca da empatia e, para melhor apresentação, foram elencadas duas categorias centrais 1) Empatia na Contemporaneidade e; 2) Enfermagem: a ciência do cuidado.

RESULTADOS

Eixo filosófico: teoria do reconhecimento

A teoria do reconhecimento de Axel Honneth visa frutificar a compreensão de reconhecimento,enquanto reflexão acerca das relações entre as pessoas. Este teórico busca explicar a dinâmica das transformações humanas, a partir de três eixos centrais: o amor, o direito e a solidariedade. Esses eixos do reconhecimento constituem dispositivos de proteção intersubjetivos, que asseguram a liberdade humana de maneira íntima, digna, respeitosa, confiante e mútua para a formação da estima social e valoração pessoal. Assim como o processo de reconhecer, a empatia busca a ação libertadora a partir da auto-realização individual, englobando o direito civil e da decisão de maneira igualitária na sociedade3.

Isso posto, o sujeito se reconhece de maneira empática no processo em que a relação com o outro aponta suas habilidades e qualidades, gerando a reconciliação e formação de uma identidade distinta e particular. O amor possibilita relações de confiança que, por sua vez, geram autoconfiança mútua impulsionando a libertação para a independência de si e do outro. O direito permite formar na pessoa a consciência de ser capaz de respeitar a si mesmo, porque merece o respeito dos outros. E por último a solidariedade refere-se à apreciação social e estima que comunica a individualização do sujeito à perspectiva coletiva3.          

Categoria 1 - empatia na contemporaneidade

A idade contemporânea caminha com uma sociedade que busca pelo conhecimento, informação e comunicação, em contrapartida, também é uma sociedade que ruma com indivíduos cada vez mais solitários4. Para compreender a civilização atual, nos remetemos a era industrial, onde surge o “homem-massa”, descrito pelo o filósofo José Ortega Gasset, retratando um indivíduo produto do conforto, consumista, hedonista, despreocupado em estabelecer relações de intimidade4. Atualmente, percebe-se uma civilização com comportamentos similares aos retratados por Ortega, onde os indivíduos buscam por tecnologias de comunicação para possibilitar a aproximação com o outro, contudo, percebe-se que essas tecnologias criam indivíduos encapsulados em seu próprio mundo, em sua própria realidade alternativa.

Pensadores contemporâneos há décadas vêm refletindo sobre o mal-estar das civilizações, onde aparece o descuido, o abandono, o descaso, a falta de cuidado. A essência humana é o cuidado3. Diante disso nos perguntamos: A sociedade atual consegue visualizar o outro como um ser que precisa de cuidado? O toque, a escuta sensível, a humanidade das relações está se perdendo em meio as tarefas, cotidiano, prazos, busca pelo conforto, idealização da vida perfeita cercada de bens materiais de última geração?

Diante desse cenário, buscamos trazer a empatia para as relações interpessoais. O ser humano é social por natureza e busca nas relações humanas conhecer sobre si mesmo e sobre outro6. A necessidade de ajuda perpetua por toda a vida do ser, e essa se manifesta a partir das relações estabelecidas com os outros, porém, nos questionamos: toda a ajuda que recebemos é empática? Quantas vezes procuramos no outro a solução de algum problema e encontramos outra situação para resolver? Atualmente a escuta nas relações está prejudicada, traços do “homem-massa” individualista e egocêntrico perpetuam no convívio e no vínculo entre os indivíduos.

A partir disso, pensamos em como as relações empáticas podem afetar os indivíduos. A escuta sensível para buscar a compreensão das situações do outro, sem julgar ou trazer experiências individuais, auxilia o outro não somente a resolver a situação pela qual está passando, mas também o sensibiliza para visualizar o outro como uma rede de apoio, e estar disposto a se colocar como suporte quando necessário. Ser empático é estar disposto a conectar-se com o outro sentimentalmente e ser um agente social de empatia, uma mola propulsora que impulsiona a sociedade para longe do “homem-massa”, buscando a essência humana, o cuidado.

Tendo em vista a necessidade de ajuda por natureza e a essência humana do cuidado, fazemos relação com os processos de saúde e doença. No âmbito da saúde, profissionais empáticos são necessários para compreender a situação do outro e fornecer cuidados da melhor forma possível, visando o olhar do outro. Para tanto, focamos na profissão do cuidado, a enfermagem, trazendo reflexões próprias do processo de trabalho. Na próxima categoria abordaremos essa ciência, mas antes gostaríamos de deixar mais uma reflexão: podemos cobrar empatia dos profissionais que cuidam se a nossa sociedade não é empática? Como ser um agente da empatia no cenário social atual sendo enfermeira (o)?

Categoria 2 - enfermagem: ciência do cuidado

Na elaboração e desenvolvimento deste tipo de relacionamento o enfermeiro deve, inicialmente, conhecer e reconhecer a outra pessoa em seu espaço e em sua vida, ou seja, em sua singularidade7. Neste sentido a empatia é abordada como uma das condições essenciais na efetivação da relação de ajuda-confiança8. A relação criada entre enfermeiro-paciente é, uma experiência vivida, espontânea e se estabelece pela linguagem e por profundas atitudes afetivas da situação pessoal9.

“Por um lado, o modelo biomédico e cartesiano, em muitos momentos, mostra-se limitado, ao não ser capaz de oferecer suporte às necessidades mais profundas da alma. Por outro, a Enfermagem tem procurado possibilidades de compreensão e formas de cuidar que possam ultrapassar os limites construídos por essa corrente de pensamento, de forma que exista valorização de condições pessoais, subjetivas e culturais dos envolvidos no processo do trabalho2”.

O Enfermeiro encontra no paciente uma relação de coletividade, integrando a natureza intelectual e emocional humana, e tornando indissociável a condição de colocar-se no lugar do outro. Quando nos reportamos à assistência à saúde não podemos esquecer da supremacia que o modelo biomédico foi dado nesse campo dos relacionamentos humanos, enfatizando-se o autoritarismo dos discursos sobre as práticas7.

Em contradição a esta insolubilidade da empatia no processo de cuidado, os Enfermeiros anseiam demasiadamente ao profissionalismo científico, e, portanto, focam mais no trabalho do que na arte da Enfermagem, dessa forma acarretando na negligência do aspecto humano da profissão9.

“No século XX as humanidades perderam espaço diante das ciências modernas, e no campo da saúde fundamentalmente em razão dos avanços biomédicos, onde os avanços tecnológicos tem produzidos peculiaridades no que se refere à prática e a formação do profissional de saúde, pois ao passo que a tecnologia aperfeiçoa as técnicas necessárias para melhor execução da profissão, acaba se tornando finalidade, resultando no esquecimento de quem é o “objeto” em questão, ou seja, o ser humano8”.

Este construto reflexivo pretende discutir aspectos importantes sobre os encontros e desencontros da empatia e cuidado em enfermagem, compreendendo suas aparências, essências e contradições, buscando propor estratégias para estabelecer o compreender empático no processo de trabalho e implementação do cuidado, bem como provocar no leitor a inquietude sobre a temática.

O processo do cuidado é multifacetado e de natureza bastante distinta, que requer, além das competências técnicas inerentes a cada profissão em particular, atitudes humanizadas e humanizadoras, bem como favorecedoras de acolhimento na área da saúde. Pressupõe relações humanizadas e éticas, construídas por meio de ferramentas tecnológicas de níveis de complexidade variados, permitindo, dessa maneira, que se fortaleçam por meio de ações humanizadoras entre aquele que cuida e aquele que é cuidado9.

O processo de cuidar de alguém, aliado a essa premissa requer habilidade auditiva sensível aos relatos e queixas do paciente e conhecimento sobre os principais sintomas presentes, pois as medidas de intervenção vão além do plano físico, uma vez que as dimensões emocionais e espirituais podem ser as mais afetadas, sendo assim, o preparo profissional torna-se indispensável, pois requer humanização, autocontrole diante dos desafios enfrentados e comprometimento para que a assistência prestada alcance o objetivo do cuidado9”.

Autores inferem que “o cuidar humano é uma atitude ética, ensinada e desenvolvida durante aformação do profissional, que permite uma relação emque os sujeitos se percebem e reconhecem os direitosuns dos outros”8, relação, essa, a qual conhecemos por empatia.

O conceito de empatia é compreendido como projeção sentimental ou um sentimento que um sujeito projeta no mundo interior do outro e, nesse enfoque trata-se de um fenômeno psicológico10.

Empatia é compreender, penetrar em saber ver com os olhos de alguém, intuição. O termo denota também a percepção e intuição clínica para os sentimentos do outro. Em sua origem, a palavra empatia vem do grego “empátheia” e significa tendência para sentir o que se sentiria caso se estivesse na situação e circunstâncias experimentadas por outra pessoa11.

A empatia pode ser vista como instrumento importante para manejo dos problemas e elaborador de estratégias para adquirir habilidade de nos colocarmos no lugar do outro, de sabermos de suas expectativas12.

“[...] possui várias vertentes, no entanto todas consideram a capacidade de compreender os sentimentos [...]. Para desenvolvimento do comportamento empático, destaca-se a real vontade em se preocupar com o sofrimento alheio, representando um processo consciente, que visa ao aprimoramento das relações interpessoais por meio da consolidação do vínculo afetivo e das habilidades comunicacionais3”.

A apreciação de como se sente internamente, o reconhecimento dos seus sentimentos, emoções, desejos, conflitos e ansiedades, apontam os limites da implementação da compressão empática na prática da enfermagem, pois diversas vezes é vista a incapacidade do profissional em reconhecer-se a si mesmo como pessoa total, com consciência dos próprios sentimentos, a tendência em separar o físico do psíquico e o fato de ser a medicina centralizada mais em si mesma que no indivíduo13.

DISCUSSÃO

Quando pensamos em cuidado em enfermagem, compreendemos ser inerente do processo de cuidar, o envolvimento e desenvolvimento de relações de ajuda e confiança13. Os relacionamentos estabelecidos são fortalecidos pela convivência diária e intensa, possibilidade do espaço de diálogo sobre a vida pessoal e sentimentos, bem como crença e cultura14.

Neste processo incessante de cuidar e relacionar-se, a relação enfermeiro-cliente torna-se pautada no respeito, considerando a “bagagem de vida” que o outro traz consigo e, principalmente, considerando o outro protagonista da sua trajetória em saúde13.

O papel da enfermagem é reconhecer, em meio ao “tumulto” do cotidiano gerado por protocolos e burocracias, que por trás da outra pessoa há uma rica e potencial relação que almeja ser saciada através do vínculo. A empatia funciona como um instrumento para estabelecer este vínculo através das vivências experimentadas, onde passa a ser considerada “ser” e “ser com”, ou seja, torna a empatia inerente ao ser social e profissional que é o enfermeiro5.

Esta habilidade de compreender as peculiaridades do outro e estar próximo dele constantemente, é considerada como o estar presente no seu viver compreendendo a empatia como uma estratégia de cuidado e prevenção de saúde. Podendo-se afirmar concisamente que a empatia promove, previne e reabilita a qualidade de vida14.

Uma relevante questão a ser discutida é voltada a área cientifica, pois o que a literatura demonstra é uma vasta e amplamente discutida consideração sobre a importância humanística da enfermagem7, alguns estudos ainda discutem precisamente a empatia relacionada à profissão5, porém, mesmo com inúmeras publicações sobre o tema, ainda é urgente a implementação de ações e comportamentos empáticos no eixo de trabalho.

São diversas as razões atribuídas a baixa efetividade de ações empáticas no processo de cuidar em enfermagem, por exemplo a elevada demanda de trabalho, a sobrecarga dos profissionais, o número reduzido de profissionais para executar o cuidado, a complexidade envolvida no processo de saúde-doença, a dificuldade pessoal de desenvolver vínculo com cliente e familiares, o medo de estabelecer o vínculo e decepcionar-se, ou até mesmo a compreensão da profissão como algo tecnicista que não inclui este tipo de “procedimento”15.

Por outro lado, as fortalezas de estabelecer uma relação empática entre enfermeiro-cliente envolvem a capacidade de compreender os sentimentos de outra pessoa e comunicá-la de tal experiência, sempre baseada nos pilares cognitivos, afetivos e comportamentais7. Para desenvolver este comportamento empático, é necessária a real vontade em se preocupar com o sofrimento alheio, consciente, que visa ao aprimoramento das relações interpessoais por meio da consolidação do vínculo afetivo e das habilidades comunicacionais15.

A empatia possui efeito terapêutico e impulsiona positivamente o sucesso do tratamento ao passo que possui caráter fundamental no desenvolvimento de respeito mútuo e singularidade do cuidado, respeitando a cultura, crenças e valores da pessoa. Diante disso, a empatia torna-se condição essencial para a melhora da qualidade de vida e maior capacidade de enfrentar os problemas do cotidiano, potencializando a independência do cliente para o autocuidado16.

Na ânsia de provar que a empatia é essencial no cuidado prestado ao cliente e que está diretamente relacionada à qualidade do atendimento, este estudo vem contribuir para reforçar a importância do desenvolvimento dessa atitude nas relações entre profissional e cliente.

CONCLUSÕES

A assistência em saúde é processo complexo, multifacetado e permeado de nuances que necessitam profundas reflexões para o alinhamento da prática assistencial com as reais necessidades dos pacientes, superando a abordagem biomédica que condiciona o tecnicismo do cuidado. O cuidar por essência é complexo e considera o ser humano dentro de suas singularidades e coletividades, visando compreender o físico, mental, emocional e espiritual, para potencializar a assistência de enfermagem, evitando o olhar unicamente biológico.

Esta reflexão de cunho filosófico faz surgir inquietações que preocupam e desafiam e ao mesmo tempo fazem-nos compreender a organização do processo de cuidado em enfermagem na sociedade contemporânea, visando assim iluminar que é necessário o aprimoramento das essências da prática atual da enfermagem.

Conflito de interesses: Os autores declaram que não houve conflito de interesses.

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