Rev Cuid 2014; 5(2): 731-8
doi: http://dx.doi.org/10.15649/cuidarte.v5i2.85
INTEGRALIDADE E SUAS INTERFACES COM A PRODUÇÃO DO CUIDADO
INTEGRALIDAD Y SUS INTERFACES CON LA PRODUCCIÓN DE CUIDADO
COMPLETENESS AND INTERFACES WITH THE PRODUCTION OF CARE
Camila Tahis dos Santos Silva1, Simone Santana da Silva2, Márlon Vinícius Gama Almeida3, Igor Brasil de Araújo4
1Graduada em Enfermagem pela Universidade do Estado da Bahia- Campus VII; +55 74 9141-3995; camila_tahis@hotmail.com
2 Mestre em Enfermagem, Docente da Universidade do Estado da Bahia- Campus VII
3 Mestre em Saúde Coletiva, docente da Universidade Federal do Recôncavo Baiano
4 Docente da Universidade do Estado da Bahia- Campus VII
Histórico: Recibido: 2 de Junio de 2014; Aceptado: 24 de Julio de 2014
Cómo citar este artículo: Silva CT, Silva S, Almeida MV, Araújo I. Integralidade e suas interfaces com a produção do cuidado. Rev Cuid. 2014; 5(2):731-8. http://dx.doi.org/10.15649/cuidarte.v5i2.85
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RESUMO
Introdução: Trata-se de uma revisão integrativa que tem como objetivos analisar as concepções de integralidade e de cuidado de saúde (e de enfermagem) evidenciada nos artigos encontrados na Biblioteca Virtual em Saúde e conhecer a relação entre integralidade e o cuidado em saúde na Atenção Primária à Saúde, relatados entre os trabalhos encontrados na BVS. Materiais e Métodos: Foi feita a seleção dos artigos que tinham como principal assunto a Atenção Primária à Saúde, publicados e indexados no banco de dados National Library of Medicine e Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde. Totalizaram 09 artigos publicados no período de 2010 a 2012. A análise dos materiais se deu através da análise de conteúdo de Bardin. Resultados e Discussão: Mostrou-se a necessidade de que a enfermagem reconheça a integralidade como norteadora de suas práticas de saúde, valendo-se do trabalho vivo em saúde para a produção do cuidado. Ao mesmo tempo em que identifiquem em seu cotidiano as várias formas de efetuá-lo, garantindo assistência de qualidade, cuidado, corresponsabilização, vínculo e intersetorialidade, na medida em que se busca a longitudinalidade do cuidado em saúde. Conclusões: A partir dos estudos reconhece-se que a integralidade é vista como um ponto chave para a produção do cuidado, desde que sejam contempladas as necessidades reais dos indivíduos, em atividades cotidianas da Atenção Primária à Saúde, no que engloba a mudança de concepções entre o modelo biomédico, ainda predominante, para um olhar que tenha foco as várias dimensões dos indivíduos.
Palavras chave: Assistência Integral à Saúde, Cuidados de Enfermagem, Prestação Integrada de Cuidados de Saúde. (Fonte: DeCS BIREME).
http://dx.doi.org/10.15649/cuidarte.v5i2.85
RESUMEN
Introducción: Se trata de una revisión integrativa que tiene como objetivos analizar las concepciones de integralidad y de cuidado de salud (y de enfermería) evidenciada en los artículos encontrados en la Biblioteca Virtual en Salud (BVS) y conocer la relación entre la integralidad y el cuidado de salud en atención primaria a la salud, reportados en los trabajos hallados en la BVS. Materiales y Métodos: Se realizó la selección de artículos que tenían como principal tema la atención primaria en salud, publicados e indexados en la base de datos de la Biblioteca Nacional de Medicina y de la Literatura Latinoamericana y del Caribe en Ciencias de la Salud. Fueron en total 09 artículos publicados en el período 2010-2012. El Análisis de los materiales se realizó a través del análisis de contenido de Bardin. Resultados y Discusión: Se mostró la necesidad de que la enfermería reconozca a la integralidad como guía a sus prácticas de salud, aprovechando el trabajo vivo en salud para la producción del cuidado. Asimismo, que identifiquen en su cotidiano las diversas formas de realizar el trabajo, garantizando una atención de calidad, cuidado, corresponsabilidad, vínculo e intersectorialidad, en la medida en que se busca el cuidado longitudinal en salud. Conclusiones: A partir de los estudios se reconoce que la integralidad es vista como un punto clave para la producción del cuidado, siempre que se aborden las necesidades reales de las personas, en actividades cotidianas de Atención Primaria en Salud, que abarquen los cambios de concepciones entre el modelo biomédico, todavía predominante, para una mirada que tenga foco a varias dimensiones de los individuos.
Palabras clave: Atención Integral de Salud, Atención de Enfermería, Prestación Integrada de Atención de Salud. (Fuente: DeCS BIREME).
http://dx.doi.org/10.15649/cuidarte.v5i2.85
ABSTRACT
Introduction: It is integrative review aims to examine the concepts of wholeness and health care (and nursing) evidenced in articles found on the Virtual Health Library (VHL) and know the relationship between completeness and health care in Primary Care Health, reported from studies in the VHL. Materials and Methods: A selection of articles whose principal subject for Primary Health Care, published and indexed in the database National Library of Medicine and the Latin American and Caribbean Literature on Health Sciences Totaled 09 published articles was made in period from 2010 to 2012. Analysis of the materials was made through the content analysis of Bardin. Results and Discussion: showed the need to recognize that nursing comprehensiveness as guiding their health practices, taking advantage of living labor in health care production. While identifying in their daily lives the various forms commencing the work, ensuring quality care, care, co-responsibility, bond and intersectionality, insofar as it seeks longitudinally of health care. Conclusions: From the studies it is recognized that comprehensiveness is seen as a key point for the production of care, provided they are addressed the real needs of individuals in everyday activities of Primary Health Care, which encompasses the changing conceptions between the still predominant biomedical model for a look that has focus the various dimensions of individuals.
Key words: Comprehensive Health Care, Nursing Care, Delivery of Health Care, Integrated. (Source: DeCS BIREME).
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INTRODUÇÃO
O Sistema Único de Saúde – SUS é fruto de lutas e movimentos sociais brasileiros, originados pela necessidade de mudança no cenário de desigualdades e para atender à população que não tem acesso aos serviços de saúde. Este sistema tem em sua essência os princípios da equidade, universalidade e integralidade da assistência, sendo este último entendido como conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do sistema (1). Acrescenta-se ainda que a Integralidade é considerada como um princípio que remete à valorização das necessidades específicas das pessoas, independentemente do nível de atenção que aquele usuário esteja inserido.
O modelo assistencial vigente ainda está marcado por práticas assistenciais pouco impactantes, o que gera conflitos ideológicos sobre o verdadeiro papel dos profissionais de saúde. Isto se dá, pois o modelo biomédico assumiu características neoliberais da estrutura capitalista em vigor, fato que exclui parte da população dos serviços de saúde. Diante deste cenário, estudos apontam a importância da adoção de condutas para a inserção e valorização dos principais sujeitos envolvidos, principalmente os usuários de forma ativa no processo de assistência à saúde, dando, assim, base à prática humanizadora da assistência (2).
A Saúde da Família, então, surge como a principal Estratégia da Atenção Primária à Saúde - APS para mudança deste modelo biomédico neoliberal e excludente, já que possibilita aos profissionais maior aproximação à realidade e ao contexto social dos usuários, de modo que integre todo o contexto de reorganização do sistema de saúde, exercendo papel fundamental na realização do cuidado (3). Destaca-se que a assistência à saúde tem como eixos norteadores as políticas de atenção e o modelo assistencial vigente. Estes, por sua vez, sofrem mudanças e são influenciados pelos aspectos econômicos e pela organização política/social do país. Neste sentido, e partindo da compreensão de que a assistência de enfermagem resulta do desdobramento de tais eixos, infere-se que seu objetivo é oferecer serviços assistenciais aos usuários, de modo a promover a integração dos setores sociais, políticos, além de ações de prevenção de doenças, cuidados assistenciais aos portadores de agravos e promoção da saúde.
Neste cenário, a produção do cuidado na saúde vem sendo entendida como forma diferenciada de olhar o usuário desses serviços. Representa assim, para o cuidado na enfermagem, a ultrapassagem da dimensão unicamente racional e assistencialista do fazer para alcançar a dimensão relacional e multidimensional do cuidado (4). Dessa forma, a Produção do Cuidado em enfermagem consiste na realização da assistência de forma mais humanizada e que contemple as necessidades específicas dos indivíduos em todos os aspectos pessoais, sociais, espirituais, ultrapassando o cuidado puramente técnico e assistencial, o que significa dar suporte e abranger o sujeito de maneira integral em suas multidimensões na tentativa de produzir o cuidado.
Este novo olhar suscitou a discussão gerada desde a Reforma Sanitária quando visava desprender o modelo biomédico centrado apontando para a produção do cuidado de um fazer integral, corresponsável e resolutivo, entre várias outras como a discussão acerca do trabalho vivo em ato descrito por Merhy (5). O autor defende ainda que para estas mudanças no modelo assistencial que tragam impactos na forma do cuidado, faz-se necessário a hegemonia do trabalho vivo sobre o trabalho morto. Neste sentido, Mehry (5), aponta para a valorização do campo relacional, e dos conhecimentos do profissional sobre a utilização de técnicas e procedimentos (características do trabalho morto). Desta forma é possível promover uma “Transição Tecnológica” (5), a qual a produção da saúde se baseie nas tecnologias leves, relacionais, e a produção do cuidado resulte de forma integralizada tendo foco nas necessidades dos usuários e nas linhas de cuidado em todos os serviços de saúde.
Com base nessa perspectiva, a integralidade torna-se chave para a produção desse cuidado relacional, baseado nas necessidades dos indivíduos, já que busca atendê-las de forma integralizada, seja com olhar multidimensional ou aumentando a resolutividade e corresponsabilização na Atenção Básica. Isso, pois se trata de um nível que permite ao profissional desempenhar esse olhar mais crítico se valendo de tecnologias leves para produzir o cuidado em saúde.
Para entendermos a importância do princípio da integralidade, sugere-se analisar sua inserção como princípio norteador de várias outras dimensões assistenciais. É o que acontece na Política da Atenção Básica no Brasil, quando vemos o princípio da integralidade se destacar atrelado a outros como a qualidade, equidade e participação social. Logo, estes princípios têm o intuito de tornar possível para as equipes de Saúde da Família o estabelecimento de vínculo com a população, possibilitando o compromisso destes profissionais com os usuários e a comunidade desde que estes princípios exerçam sua finalidade (6).
Assim, o presente trabalho se faz necessário na medida em que a necessidade de mudança e reorientação das práticas assistenciais se torna evidente, frente à problemática vivenciada no campo saúde. Intenciona-se ainda, a possibilidade de visualização da relação entre a integralidade como condição necessária a produção do cuidado em saúde. A questão norteadora deste trabalho é: Qual a concepção de integralidade e de cuidado de saúde (e de enfermagem) evidenciada nos artigos encontrados na Biblioteca Virtual em Saúde - BVS? Há relação entre o princípio da integralidade e a produção do cuidado demonstrada por estes trabalhos?
Com base nessa perspectiva, os objetivos deste trabalho consistem em discutir/apontar as concepções de integralidade e de cuidado de saúde (e de enfermagem) evidenciada nos artigos encontrados na Biblioteca Virtual em Saúde - BVS; conhecer a relação entre integralidade e o cuidado em saúde na APS relatados entre os trabalhos encontrados na BVS.
MATERIAIS E MÉTODOS
Esse estudo trata-se de uma revisão integrativa, desenvolvido a partir de fontes secundárias, obtendo ampla abordagem metodológica referente às revisões, pois permite a inclusão de estudos experimentais e não-experimentais para uma compreensão completa do fenômeno analisado (7). Sendo assim, oferece a vantagem de maior cobertura pelo investigador de uma variedade de fenômenos.
Tem abordagem descritiva, pois tem a finalidade de descrever o tema abordado, descrever fenômenos ou estabelecer relações entre variáveis, descrever características de um determinado grupo e estudos de opinião, de motivações, de mercado e socioeconômico (8). Dessa forma, a escolha deste recurso metodológico se resume à busca de um denominador em comum dos trabalhos que dissertem sobre o tema analisado.
Segundo Mendes, Silveira e Galvão (9), as etapas que compõem esta revisão integrativa são: identificação do tema e seleção da hipótese ou questão de pesquisa para a elaboração da revisão integrativa; estabelecimento de critérios para inclusão e exclusão de estudos/amostragem ou busca na literatura; definição das informações a serem extraídas dos estudos selecionados/categorização dos estudos; avaliação dos estudos incluídos na revisão integrativa; interpretação dos resultados; e por fim apresentação da revisão/síntese do conhecimento.
O primeiro passo, para a coleta de dados foi reunir o material bibliográfico disponível. Para isso, foram feitas buscas, exclusivamente, na Biblioteca Virtual em Saúde - BVS, no mês de agosto de 2013. Foram encontrados vários artigos que abordavam o tema, mas os critérios de inclusão definidos para a seleção foram: artigos publicados em português; artigos disponíveis na íntegra que retratassem a temática em estudo, tendo como principal assunto a Atenção Primária à Saúde e artigos publicados e indexados no banco de dados National Library of Medicine – MEDLINE e Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde – LILACS, sendo selecionados artigos que abordavam a temática, publicados entre os anos de 2010 e 2013, sendo todos lidos na íntegra.
Utilizaram-se os seguintes Descritores em Ciências de Saúde (DeCS) para busca no banco de dados: prestação integrada de cuidados de saúde, com 05 estudos; cuidados integrais de saúde, 12 artigos; e cuidados de enfermagem com 84 publicações. Realizou-se a leitura dos resumos de todos e, a partir daí, foram excluídos os materiais repetidos e àqueles que não abordavam a temática. Dessa maneira, resultaram 09 artigos publicados no período de 2010 a 2012, já que não houve estudos no ano de 2013 que contemplassem o tema abordado.
Dessa forma, os artigos foram lidos de maneira exaustiva e foi feita uma análise do conteúdo com base nos resultados e conclusão dos trabalhos. Ressalta-se que, de forma imparcial, foram extraídas as informações de cada estudo, para posterior avaliação dos resultados mediante o método de Bardin descrito por Minayo (10). Segundo a autora, o método permite a busca de interpretação cifrada do material, possibilitando o arranjo em categorias temáticas. A análise das categorias baseou-se em observar resultados mais frequentes, correspondentes a interpretação e fundamentação dos resultados na avaliação crítica dos estudos incluídos através de comparação com o conhecimento teórico, a identificação de conclusões e implicações resultantes da revisão integrativa (9).
RESULTADOS
Caracterização dos estudos
O quadro 01 a seguir descreve as publicações em seus principais aspectos, como autor, título do trabalho, periódico, ano de publicação, e os objetivos de cada trabalho. Destaca-se a qualificação dos periódicos com base nos critérios Capes de classificação, sendo a maioria das publicações em periódicos tendo um artigo em periódico de classificação A2, três artigos em periódico B2 e cinco publicações em periódicos com classificação B1.
Já em relação à abordagem, oito dos artigos se tratavam de estudos qualitativos e somente um dos trabalhos teve abordagem quantitativa, se tratando de um estudo transversal. Em relação ao ano de publicação, dois artigos foram publicados em 2010, cinco em 2011 e dois em 2012.
Os estudos foram analisados através de leitura exaustiva, sendo categorizados de acordo com seus objetivos e resultados em comum, bem como aos objetivos deste trabalho. Dessa forma, foram aglomerados em duas categorias temáticas: Integralidade e seus (re) arranjos para produção do cuidado, com 5 artigos e os sentidos e concepções da integralidade na AB, com 4 estudos.
Quadro 1. Distribuição das publicações incluídas na revisão integrativa. MEDLINE e LILACS, 2012
Fonte: O próprio autor
DISCUSSÃO
Integralidade e a produção do cuidado
Nesta categoria foram reunidos artigos que contemplassem a integralidade e sua relação com a produção do cuidado. Os 03 artigos foram resultados de pesquisas referentes ao cuidado prestado a grupos definidos de trabalho em saúde. Nestes, os objetivos, como traz o quadro 01, consistiam em descrever ou identificar os cuidados de enfermagem prestados e estes indivíduos com base na perspectiva da integralidade, direcionados ao cuidado com as crianças, adolescentes e em saúde mental. Já os outros dois trabalhos buscavam compreender a prática do cuidado prestado pelas enfermeiras e o conceito de longitudinalidade do cuidado em saúde.
Logo, a identificação dos requisitos essenciais para prestação do cuidado dentro desta perspectiva denunciou o quanto a abordagem biomédica ainda é utilizada, sendo um entrave para a efetivação da integralidade (11). Embora exista o reconhecimento das práticas do cuidado de forma mais integral e relacional descrita por Mehry (5), os enfermeiros não conseguem articular estas práticas de modo que contemple a produção do cuidado em si.
Os resultados dos trabalhos mostraram que as enfermeiras não mencionaram diretamente o cuidado como prática, mas afirmaram realizá-lo em seu cotidiano como técnica, orientação em saúde, valorização, acolhimento, ver o indivíduo como um todo, identificação de problemas e sua resolução e organização (11). Infere-se, frente aos aspectos citados, que o cuidado está diretamente ligado às atribuições e atividades desenvolvidas pelos profissionais em seu cotidiano. Tais práticas perpassam os conhecimentos técnicos e concretizam a forma de cuidado nas relações com os indivíduos através dos aspectos como a orientação em saúde, acolhimento, valorização e o olhar multidimensional sobre este usuário.
Isto é expressivo nos trabalhos que mostram como os profissionais focalizam o acolhimento e vínculo como ferramentas chave para a execução do cuidado. Demonstram ainda que os profissionais se reconhecem como peças importantes para o processo de cuidado, apesar de existirem poucas iniciativas institucionalizadas a fim de aperfeiçoar a utilização deles na produção do cuidado nos serviços de saúde. Além disso, é válido evidenciar que esta é uma tarefa que fica estritamente ligada ao papel da enfermeira, já que há pouca participação de outros profissionais (12).
Da mesma forma, a corresponsabilização e resolutividade também foram reconhecidos como importantes no cuidado com base na integralidade, apesar de se desenvolverem timidamente, pois a resolubilidade está associada à utilização eficiente das tecnologias em saúde disponíveis principalmente na AB, quando se resumem a tecnologias leve e leve-dura. Sendo assim, esta resolutividade depende da condução e competência profissional, além dos encaminhamentos que são realizados.
O enfoque familiar também foi visto como aspecto importante, e partícipe da produção do cuidado, pois “é produto e produtor do trabalho feito por profissionais, família e comunidade” (13-14), e embora os estudos apontem o modelo de PSF bastante favorável a esta conduta, os profissionais do PSF não conseguem ainda cuidar dos usuários portadores de transtornos mentais de forma ideal. Isto se dá, pois muitos profissionais ainda estão muito presos à unidade, deixando o portador de transtorno mental à parte da AB, não conseguindo estabelecer vínculo no seu ambiente familiar (15). É evidente que este aspecto compromete a produção do cuidado para estes indivíduos que não tem seus aspectos familiares envolvidos no processo de cuidar, além de que o vínculo não consegue se estabelecer de forma desejada. Logo, há o comprometimento dos aspectos multidimensionais e da integralidade envolvida na produção do cuidado em saúde.
A articulação intersetorial é outro entrave no sistema, já que ocorre de forma deficiente, o que dificulta a continuidade do cuidado, pois envolve as atividades de referência e contrarreferência como propagadoras do cuidado, e ainda responsáveis pela viabilização da longitudinalidade do cuidado. A relação entre a longitudinalidade com a integralidade, é vista quando o profissional passa a compreender o indivíduo em seus múltiplos aspectos oferecendo um cuidado integral, baseando-se no enfoque familiar com vistas às suas necessidades, e acompanhamento do indivíduo ao longo do tempo tendo maior efetividade na resolutividade das ações direcionadas a estas necessidades. Além disso, a longitudinalidade é associada à integralidade por esta ser um dos princípios da APS e da Política Nacional da Atenção Básica- PNAB, e estar atrelada à resolução e o acesso a todos os serviços e níveis de atenção necessários para se obter a longitudinalidade ou continuidade do cuidado (16).
Sentidos e concepções da integralidade na Atenção Básica
Quatro artigos descrevem a integralidade, conceituando-a a partir de enfoques diversos, na medida em que relacionam com a prática do cuidado. Dessa forma, alguns aspectos foram abordados no sentido de estabelecera integralidade como prática na APS, tanto na visão de usuários quanto de profissionais e gestores, obtendo assim um leque de significações e formas de praticá-la.
Um dos trabalhos mostrou o reconhecimento da integralidade somente como forma de enxergar o indivíduo em sua multidimensionalidade, como já citado por Backes (4), agregando também ao atendimento integral visto como norte da prática clínica e crítica à dissociação das práticas preventivas e curativas (17). Isso incita, portanto, inferir que seria a falta de propriedade sobre os princípios e diretrizes do SUS, ou ainda desarticulação das práticas preconizadas pelo SUS, já que não foi explicitado o uso da integralidade como princípio do SUS e norteador das práticas assistenciais.
Esta crítica à dissociação entre as práticas de prevenção e reabilitação da saúde também foi demonstrado como sentido de integralidade por outro trabalho, onde Heimann e colaboradores (18), ao analisar a APS como estratégia para alcançar sistemas integrais e universais. Cita a integralidade como uma das dimensões da APS, resultante da superação entre sistemas públicos e privados, níveis de atenção e entre as práticas de promoção, prevenção e reabilitação da saúde. Para a operacionalização deste princípio, aponta a interdisciplinaridade no planejamento de ações, trabalho em equipe e em redes, acesso e articulação entre os níveis de atenção e nos sistemas de referência e contrarreferência, que são características da regionalização, concluindo assim, que a integralidade é o ponto forte da APS.
A integralidade também foi objeto de análise de dois artigos (19,20), em que usa aspectos caracterizados como as dimensões para sua efetividade, comparando os tipos de organizações da AB. Mostra que a ESF tem avaliações satisfatórias, já que permite maior vínculo e enfoque familiar. Neste contexto os aspectos referidos no trabalho como pressupostos básicos para a efetivação da integralidade são: porta de entrada, que são as ações relativas ao acolhimento e acesso; elenco de serviços, ligados a atividades de prevenção e controle da saúde; coordenação do serviço, já que a APS é vista como principal porta de entrada para referenciamento às especialidades; vínculo, através das relações de comunicação com os profissionais e da longitudinalidade do cuidado, e por fim o enfoque familiar, que teve pior avaliação, devido à falta de engajamento profissional (19,20).
Tendo em vista todos estes pressupostos que visam afirmar a integralidade na APS, faz-se necessária avaliação e reflexão destes aspectos objetivando sua efetividade e aprofundamento nas práticas de saúde. Através dos estudos, que apontaram o enfoque familiar como ponto crítico, deve-se direcionar olhar mais reflexivo a este aspecto, tendo como pressuposto a família como núcleo de cuidado e importante fator para a execução do mesmo, além de proporcionar uma assistência mais especializada e direcionada ao sujeito de forma mais completa.
Ayres e colaboradores (20), ainda concluem que a APS tem todos os requisitos necessários para realizar mudanças no campo assistencial que caminhem na direção da integralidade, já que tem aspectos de atuação multiprofissional, transdisciplinar e intersetorial, e que pode servir de local de constante diálogo. Através destes, acumula capacidade para produzir comunicação e construção de redes, caracterizando projetos de atenção a grupos específicos, como no caso do estudo voltado aos adolescentes, porém encontra barreiras na insuficiência de interações profissionais e setoriais, configurando fragilidades na comunicação dos profissionais entre si e dos profissionais com os usuários.
Todos estes estudos mostram de maneira clara que a integralidade exerce grande influência nas formas de gerir, participar, e produzir o cuidado em saúde. Da mesma forma, em que apresentam um variado leque de sentidos, concepções e aspectos inerentes a efetividade deste princípio. Apesar de alguns não reconhecerem como um princípio que fundamenta o SUS e outras políticas de saúde, muitos mostram que se trata de um ângulo fundamental na APS, em especial na ESF.
CONCLUSÕES
A guisa de conclusão compreende-se a pequena oferta de estudos atualizados sobre Integralidade e cuidado na APS. Ressalta-se a importância da constante reflexão acerca destes dois temas de extremo destaque nos serviços de saúde. Apesar disso, os objetivos deste trabalho foram contemplados já que se identificaram conceitos de integralidade e sua relação com a produção do cuidado em saúde, bem como os conceitos de cuidado na AB.
Foi possível observar que a integralidade é vista como um ponto chave para a produção do cuidado, desde que sejam contempladas as necessidades reais dos indivíduos, em atividades cotidianas da APS, no que engloba a mudança de concepções entre o modelo biomédico, ainda predominante, para um olhar que tenha foco as várias dimensões dos indivíduos. Entre as dimensões pode-se destacar: aspectos sociais, psicológicos além dos aspectos biológicos que contemplem as necessidades do indivíduo. Ressalta-se ainda que apesar de o cuidado em saúde não ser reconhecido e denominado como tal, percebe-se que há o reconhecimento destas expressões do cuidado nas atividades desenvolvidas pela enfermeira na APS.
Os sentidos e concepções apontados para a integralidade, também estão presentes, o que permitiu avaliar algumas realidades nesta perspectiva, como visto anteriormente. Logo, entre os aspectos representados como formas de consolidação da integralidade identificadas foram: acesso, acolhimento, vínculo, enfoque familiar, longitudinalidade, corresponsabilização, intersetorialidade correspondente aos sistemas de referência e contrarreferência e resolutividade. Estas exercem influência para produção do cuidado baseado na integralidade do sujeito, pois contempla desde o acesso, a porta de entrada do SUS que é a APS, a forma como o sujeito é acolhido pelos profissionais, o vínculo que se estabelece nas relações de cuidado envolvendo também a família, além dos aspectos relacionados à organização dos serviços que possibilitem a continuidade, resolutividade e intersetorialidade necessária ao acompanhamento integral do sujeito.
Ficou claro que, de todos os aspectos, as avaliações menos favoráveis se relacionaram ao enfoque familiar, resultante da fragilidade do comprometimento profissional que pode ser atribuído também ao despreparo profissional e acúmulo de trabalho, além da falta de comprometimento e corresponsabilização do usuário. Associado a isto, insere-se a enfermeira, a qual é incluída no contexto da AB como principal sujeito articulador das ações de cuidado e capaz de reverter esta realidade. Além disso, ganha lugar de destaque a intersetorialidade, a qual representa um grande obstáculo para efetivação da integralidade, visto que os sistemas de referência e contrarreferência encontram-se em desenvolvimento, e são executados de forma deficiente o que dificulta, portanto, a continuidade do cuidado. Isto requer melhor direcionamento e atenção por parte de políticas, e consequentemente das instâncias gestoras, que busquem efetivar de fato a regionalização.
Dessa forma, buscou-se identificar a importância do princípio da integralidade e a produção do cuidado de enfermagem na APS, a fim de que a enfermagem reconheça este princípio como norte orientador de suas práticas de saúde, valendo-se do trabalho vivo em saúde para a produção do cuidado. Ao mesmo tempo em que identifiquem em seu cotidiano as várias formas de efetuá-lo, garantindo assistência de qualidade, cuidado, corresponsabilização, vínculo e intersetorialidade, na medida em que se busca a longitudinalidade do cuidado em saúde.
Conflito de interesses: Os autores declaram que não há conflito de interesses.
REFERÊNCIAS